domingo, 25 de abril de 2010

Os conservadores e o movimento.



Quando os conservadores começam a alardear sua revolta e a blasfemar contra o tempo presente é porque as mudanças atingiram um ponto sem volta, irrevogável. Os possíveis argumentos contrários, que exprimiriam seus receios diante das mudanças, esgotaram-se; por isto, passam a tomar a forma de ataques, disfarçados ou não, e acusações absurdas e irracionais que aludem, por vezes, ao conspiratório. É nesse momento que palavras como "inadimissível", "vergonha", "decadência", "inversão de valores" começam a pipocar repetitivamente.

Por isso, antes de indignar-me com a histeria e os ataques desleais e preconceituosos dos conservadores, alegro-me por notar que as irrupções que acenevam para uma possível nova configuração do mundo e que prometiam sacudir e interrogar o estado das coisas, isto é, o mundo monótono e seguro dos conservadores, inscreveram-se, nesse momento, de maneira definitiva em nossa experiência histórica, fazendo visível, por direito, vozes e práticas antes sufocadas, conferindo-lhes um lugar legítimo e assegurado no mundo.

A reação conservadora, que por vezes utiliza-se de meios tão ridículos quanto se valeram alguns estudantes de Farmácia da USP, é um remorso estéril cujo intuito impossível é frear o movimento e a força de mundo em vias de mudança. Em função disso, desde já ela carrega na boca e no gesto um mundo em agonia, moribundo, ao qual procura dar seus últimos espasmos de vida. Foi assim com instauração do voto para as mulheres, com o divórcio e o uso da pílula anticoncepcional, e antes com a queda das monarquias absolutistas, depois com fim da escravidão e da segregação racial. Todos esses acontecimentos, e, outros tantos, portavam, cada um ao seu modo, novas realidades e novos sujeitos que instauraram diferenças e deslocamentos significativos no repertório de nossas percepções e modalidades relacionais social e culturalmente institucionalizadas. Eles carregavam o hálito das novidades que atesta o definhamento de certas idéias, opiniões, pensamentos, práticas, e às vezes, de uma forma de vida inteira.

Hoje, em boa parte do mundo ocidental, os homossexuais já colhem os frutos de sua árdua luta pela conquista de um espaço social e político que pouco a pouco enterra velhas percepções. Ganham direitos e liberdades; suas práticas amorosas, desejos de união e a manifestação de sua sexualidade são inscritas, pela força das leis, num mesmo regime de igualdade que a dos heterossexuais, doa a quem doer.

A luta dos escamoteados e expropriados historicamente do espaço público e do espaço da humanidade, ainda que não logre êxitos totais, não deixa de produzir efeitos incontornáveis que, de certa maneira, reorganizam a vida e as relações segundo novas percepções e formas de equilíbrio e conflito. E, assim, o movimento que os conservadores tentam barrar persiste, avança. Quando baralho é demasiado é porque algo mudou para sempre.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Entrevista: O que resta da Ditadura?



Leia abaixo a entrevista publicada pela Agência Brasil com o filósofo Vladimir Safatle, professor de Filosofia da USP. Safatle é co-organizador do livro recém-lançado pela editora Boitempo O que resta da Ditadura. Segundo o filósofo, o Brasil continua uma democracia imperfeita por resistir a uma reavaliação do período militar (1964-1985).


Agência Brasil: O Brasil tem alguma dificuldade com o seu passado?

Vladimir Safatle: Existe um esforço de vários setores da sociedade em apagar a ditadura, quase como se ela não tivesse existido. Há leituras que tentam reduzir o período à vigência do AI-5 [Ato Institucional nº 5], de 1968 a 1979. E o resto seria uma espécie de democracia imperfeita, que não se poderia tecnicamente chamar de ditadura.

Ou seja, existe mesmo no Brasil um esforço muito diferente de outros países da América Latina, que passaram por situações semelhantes, que era a confrontação com os crimes do passado. É a ideia de anular simplesmente o caráter criminoso de um certo passado da nossa história.

ABr: Há quem diga que o Brasil não teve de fato uma ditadura clássica depois de 1964, mas sim uma “ditabranda” se comparada à da Argentina e a do Uruguai, por exemplo.

Safatle: Essa leitura é do mais clássico cinismo. É inadmissível para qualquer pessoa que respeite um pouco a história nacional. Afirmar que uma ditadura se conta pela quantidade de mortes que consegue empilhar numa montanha é desconhecer de uma maneira fundamental o que significa uma ditadura para a vida nacional. A princípio, a quantidade de mortes no Brasil é muito menor do que na Argentina. Mas é preciso notar como a ditadura brasileira se perpetuou.

O Brasil é o único país da América Latina onde os casos de tortura aumentaram após o regime militar. Tortura-se mais hoje do que durante aquele regime. Isso demostra uma perenidade dos hábitos herdados da ditadura militar, que é muito mais nociva do que a simples contagem de mortes.

ABr: Qual o reflexo disso?

Safatle: Significa um bloqueio fundamental do desenvolvimento social e político do país. Por outro lado, existe um dado relevante: a ditadura de certa maneira é uma exceção. Ela inaugurou um regime extremamente perverso que consiste em utilizar a aparência da legalidade para encobrir o mais claro arbítrio. Tudo era feito de forma a dar a aparência de legalidade.

Quando o regime queria de fato assassinar alguém, suspender a lei, embaralhava a distinção entre estar dentro e fora da lei. Fazia isso sem o menor problema. Todos viviam sob um arbítrio implacável que minava e corroía completamente a ideia de legalidade. É um dos defeitos mais perversos e nocivos que uma ditadura pode ter. Isso, de uma maneira muito peculiar, continua.

ABr: Então, a semente da violência atual do aparato policial foi plantada na ditadura?

Safatle: Não é difícil fazer essa associação, pois nunca houve uma depuração da estrutura policial brasileira. É muito fácil encontrar delegados que tiveram participação ativa na ditadura militar, ainda em atividade.

No estado de São Paulo, o ex-governador Geraldo Alckmin indicou um delegado que era alguém que fez parte do DOI-Codi [Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna]. Teve toda uma discussão, mas esse debate não serviu sequer para ele voltasse atrás na nomeação. Se você levar em conta esse tipo de perenidade dos próprios agentes que atuaram no processo repressivo, não é difícil entender por que as práticas não mudaram.

ABr: Estamos atrás de outros países, como Argentina e África do Sul, na investigação e julgamento de crimes cometidos pelo Estado?

Safatle: Estamos aquém de todos os países da América Latina. Nosso problema não é só não ter constituído uma comissão de verdade e justiça, mas é o de que ninguém do regime militar foi preso. Não há nenhum processo. O único processo aceito foi o da família Teles contra o coronel [Carlos Alberto Brilhante] Ustra, que foi uma declaração simplesmente de crime.

Ninguém está pedindo um julgamento e sim uma declaração de que houve um crime. Legalmente, sequer existiram casos de tortura, já que não há nenhum processo legal. E levando em conta o fato de que o Brasil tinha assinado na mesma época tratados internacionais, condenando a tortura, nossa situação é uma aberração não só em relação à Argentina e à África do Sul, mas em relação ao Chile, ao Paraguai e ao Uruguai.

ABr: Que expectativa o senhor tem quanto ao funcionamento da Comissão Nacional da Verdade, prevista no Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3), para apurar crimes da ditadura?

Safatle: Uma atitude como essa é a mais louvável que poderia ter acontecido e merece ser defendida custe o que custar. O trabalho feito pelo ministro Paulo Vannuchi [secretário dos Direitos Humanos, da Presidência da República] e pela Comissão de Direitos Humanos é da mais alta relevância nacional. Acho que é muito difícil falar o que vai acontecer.

A gente está entrando numa dimensão onde a memória nacional, a política atual e o destino do nosso futuro se entrelaçam. Existe uma frase no livro 1984, de George Orwell, que diz: “Quem controla o passado controla o futuro”. Mexer com esse tipo de coisa é algo que não diz respeito só à maneira que o dever de memória vai ser institucionalizado na vida nacional, mas à maneira com que o nosso futuro vai ser decidido.

ABr: Mas, antes mesmo da criação da Comissão da Verdade, os debates já estão muito acalorados.

Safatle: O melhor que poderia acontecer é que se acirrassem de fato as posições e cada um dissesse muito claramente de que lado está. O país está dividido desde o início. Veja a questão da Lei da Anistia. O programa do governo [PNDH 3] em momento algum sugeriu uma forma de revisão ou suspensão da lei.

O que ele sugeriu foi que se abrisse espaço para a discussão sobre a interpretação da letra da lei. Porque a anistia não vale para crimes de sequestro e atentados pessoais. A confusão que se criou demonstra muito claramente como a sociedade brasileira precisa de um debate dessa natureza, o mais rápido possível. Não dá para suportar que certos segmentos da sociedade chamem pessoas foram ligadas a esses tipos de atividades de “terroristas”.

É sempre bom lembrar que no interior da noção liberal de democracia, desde John Locke [filósofo inglês do século 17], se aceita que o cidadão tem um direito a se contrapor de forma violenta contra um Estado ilegal. Alguns estados nos Estados Unidos também preveem essa situação.

ABr: O termo “terrorista” é usado por historiadores que não têm qualquer ligação com os militares e até mesmo por pessoas que participaram da luta armada. Usar a palavra é errado?

Safatle: Completamente. É inaceitável esse uso que visa a criminalizar profundamente esse tipo de atividade que aconteceu na época. A ditadura foi um estado ilegal que se impôs através da institucionalização de uma situação ilegal. Foi resultado de um golpe que suspendeu eleições, criou eleições de fachada com múltiplos casuísmos. Podemos contar as vezes que o Congresso Nacional foi fechado porque o Executivo não admitia certas leis.

O fato de ter aparência de democracia porque tinham algumas eleições pontuais, marcadas por milhões de casuísmos, não significa nada. No Leste Europeu também existiam eleições que eram marcadas desta mesma maneira.Um Estado que entra numa posição ilegal não tem direito, em hipótese alguma, de criminalizar aqueles que lutam contra a ilegalidade. Por trás dessa discussão, existe a tentativa de desqualificar a distinção clara entre direito e Justiça.

Em certas situações, as exigências de Justiça não encontram lugar nas estruturas do Direito tal como ele aparecia na ditadura militar. Agora, existem certos setores que tentam aproximar o que aconteceu no Brasil do que houve na mesma época na Europa, com os grupos armados na Itália e na Alemanha. As situações são totalmente diferentes porque nenhum desses países era um Estado ilegal. E não há casos no Brasil de atentado contra a população civil. Todos os alvos foram ligados ao governo.

ABr: Os assaltos a banco não seriam atentados às pessoas comuns que estavam nas agências?

Safatle: Todos os que participaram a atentados a bancos não foram contemplados pela Lei da Anistia e continuaram presos depois de 1979. Pagaram pelo crime. Isso não pode ser utilizado para bloquear a discussão. Dentro de um processo de legalidade, de maneira alguma o Estado pode tentar esconder aquilo que foi feito por cidadãos contra eles, como se fossem todos crimes ordinários. Se um assalto a banco é um crime ordinário, eu diria que a luta armada, a luta contra o aparato do Estado ilegal, não é. Isso faz parte da nossa noção liberal de democracia.

ABr: Que democracia é a nossa que tem dificuldades de olhar o passado?

Safatle: É uma democracia imperfeita ou, se quisermos, uma semidemocracia. O Brasil não pode ser considerado um país de democracia plena. Existe uma certa teoria política que consiste em pensar de maneira binária, como se existissem só duas categorias: ditadura ou democracia. É uma análise incorreta. Seria necessário acrescentar pelo menos uma terceira categoria: as democracias imperfeitas.

ABr: O que isso significa?

Safatle: Consiste em dizer basicamente o seguinte: não há uma situação totalitária de estrutura, mas há bloqueios no processo de aperfeiçoamento democrático, bloqueios brutais e muito visíveis. Existe uma versão relativamente difundida de que a Nova República é um período de consolidação da democracia brasileira. Diria que não é verdade.

É um período muito evidente que demonstra como a democracia brasileira repete os seus impasses a todo momento. O primeiro presidente eleito recebeu um impeachment, o segundo subornou o Congresso para poder passar um emenda de reeleição e seu procurador-geral da República era conhecido por todos como “engavetador-geral”, que levou a uma série de casos de corrupção que nunca foram relativizados. O terceiro presidente eleito muito provavelmente continuou processos de negociação com o Legislativo mais ou menos nas mesmas bases.

Chamar isso de consolidação da estrutura democrática nacional é um absurdo. Os poderes mantêm uma relação problemática, uma interferência do poder econômico privado nas decisões de governo. Um sistema de financiamento de campanhas eleitorais que todos sabem que é totalmente ilegal e é utilizado por todos os partidos sem exceção.

Índice de desemprego global é mais alto entre os jovens.

A recessão global fez com que o índice de desemprego aumentasse quase em todo o mundo e em quase todas as faixas etárias. Mas a crise foi mais dura para com os jovens, cujas taxas de desemprego aumentaram mais do que as dos adultos.

O modo pelo qual os jovens foram afetados parece ter a ver em parte com a severidade da crise em cada país, e em parte com as leis e práticas trabalhistas locais. Alguns dos jovens mais afetados estão nos países que têm mais proteções legais para os trabalhadores mais velhos.

A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), que inclui 29 países, na maioria ricos, divulgou um estudo esta semana sobre o desemprego juvenil, antes de uma reunião dos ministros do trabalho do Grupo dos 20 marcada para esta segunda-feira em Washington.

“Há atualmente quase 15 milhões de jovens desempregados nos países da OCDE, cerca de mais 4 milhões do que no final de 2007”, afirma o estudo, escrito por Stefano Scarpetta, Anne Sonnet e Thomas Manfredi, todos da sede da organização em Paris.

A maior taxa de desemprego de jovens – categoria que vai dos 15 aos 24 anos na maioria dos países, e dos 16 aos 24 em outros – está na Espanha, onde no último trimestre do ano passado o índice ficou em 39,6%, mais do que o dobro dos 19,1% de dois anos atrás. Para os adultos, a taxa aumentou de 7,4% para 16,9%.

A Espanha, assim como muitos países europeus, oferece proteção para aqueles que têm empregos fixos, um fato que levou alguns empregadores a expandirem as vagas temporárias, que fornecem menos benefícios. “A maioria dos empregos perdidos foram registrados entre os trabalhadores que tinham empregos temporários, muitos deles jovens”, diz o estudo.

As taxas de desemprego mostram a porcentagem de pessoas em idade ativa que estão desempregadas. Os jovens que ainda estão na escola são excluídos dessa conta. Assim como aqueles que abandonaram a escola e não estão procurando trabalho, mesmo que não o façam porque pensam que o esforço é inútil.

A exceção à essa tendência é a Alemanha, onde o desemprego dos jovens na verdade caiu para 10,3% no período de dois anos. O estudo atribuiu isso em parte a “um sistema bem sucedido de treinamento profissionalizante que assegura à maioria dos jovens uma transição relativamente fácil da escola para o mercado de trabalho.”

Nos Estados Unidos, o índice aumentou de 11,1% para 19,1%. Isso deixou os EUA com uma taxa um pouco maior do que a média de 18,4% dos 29 países.

Para a maioria das pessoas, diz o estudo, os efeitos do desemprego juvenil são temporários, e logo os jovens conseguirão empregos que ofereçam salários adequados. “Mas para os jovens menos favorecidos, que não tiveram uma educação básica, é difícil superar uma falha em sua primeira experiência no mercado de trabalho e isso pode expô-los a prejuízos a longo prazo.”

O estudo elogiou os esforços que estão sendo feitos em alguns países para oferecer treinamento profissionalizante aos jovens que saíram da escola e estão desempregados, mas alertou que o treinamento precisa fornecer aos jovens habilidades que possam ser usadas no mercado.


Tradução: Eloise De Vylder

Fonte: The New York Times – http://www.nytimes.com/

quarta-feira, 21 de abril de 2010

França apresentará projeto de lei para proibir véu integral

O governo francês anunciou nesta quarta-feira que apresentará em maio um projeto de lei que contemple a proibição do uso do véu islâmico integral - burca e niqab - em todos os espaços públicos e não apenas nos prédios estatais.

O anúncio foi feito pelo porta-voz do governo, Luc Chatel, após uma reunião de gabinete com o presidente Nicolas Sarkozy, que mais uma vez declarou que o véu integral é um "atentado à dignidade das mulheres"."O objetivo é impedir que o fenômeno avance. Legislamos para o futuro, o uso do véu integral é um sinal de recolhimento comunitário e uma rejeição de nosso valores", afirmou o porta-voz do governo, antes de recordar que 2.000 muçulmanas usam o véu integral na França.

A decisão do Executivo francês significa que o projeto de lei deve ser submetido ao Conselho de Estado, a principal instância administrativa na França, que no fim de março advertiu que uma proibição total da burca e do niqab poderia ser rejeitada do ponto de vista jurídico.O Conselho de Estado rejeitou uma proibição geral e absoluta do véu islâmico integral, mas admitiu que "exigências próprias de determinados serviços públicos justificariam a obrigação de manter o rosto descoberto".

Fonte: site UOL

domingo, 18 de abril de 2010

A Ciência também é isto:



As pesquisas sobre Q.I, e suas correlações com as mais estranhas variáveis e comportamentos, possuem uma longa tradição na ciência – sobretudo nos EUA - e, desde muito, constituem um dos principais meios de propaganda e conquista de prestígio e renome junto à “opinião pública” e à mídia de uma maneira rápida e pouco desgastante. Basta aplicar algumas pilhas de questionários, uma análise estatística básica, acrescente variáveis como infidelidade, crença, rendimento acadêmico, e cruze com os dados coletados de acordo com certos perfis e pronto, todas as inferências já estão logicamente justificadas pela transparência dos números sem maiores problemas e dúvidas!

Sob uma estratégia similar, Satoshi Kanazawa, psicólogo evolucionista da London School of Economics and Political Science, publicou na revista da Associação Americana de Sociologia, a Social Psychology Quaterly, um extenso artigo intitulado; "Porque os liberais e ateus são mais inteligentes.”.

Em síntese, o argumento central é o seguinte: se considerarmos a inteligência como um produto evolutivo resultante da exposição às novas situações e demandas relativas à espécie, sua sobrevivência e desenvolvimento, a inteligência mais capaz é aquela que consegue adaptar-se a essas novas situações e dar continuidade ao processo de evolução da espécie. Desse ponto de vista, o autor sustenta que o liberalismo e o ateísmo são respostas adaptativas a situações novas, do “ponto de vista evolucionário”, que surgiram para espécie. E, por não recorrerem à explicação em termos de natural ou sobrenatural, como os religiosos e conservadores, eles impelem a inteligência, em sua empresa para adaptar-se às novas condições evolutivas, a um salto, a uma evolução, progresso, ou seja, a novas inclinações e práticas. Logo, segundo Satoshi, ateus e liberais tendem a ser mais inteligentes, pois suas disposições psicológicas e sociais são sinais evolutivos da espécie, na medida em que constituem uma abertura/adaptação/resposta ao uma “novidade evolucionária”. O mesmo argumento se estende aos monogâmicos.

O espantoso não é nem tanto o reducionismo desses barbarismos intelectuais e provincianos, que mais buscam lucros editoriais e midiáticos do que o aprimoramento e a sofisticação dos horizontes da pesquisa científica e de seus desdobramentos, mas o silêncio e a pouca atenção dada pelos filósofos e sociólogos, enfim, das humanidades em geral. Pesquisas desse tipo, e sua fácil penetração nos meios de comunicação, revelam uma indiferença explícita, seja por ignorância ou desprezo, às humanidades; a sua história intelectual e seus trabalhos.

Não se trata apenas de uma questão científica -, de criticar as pressuposições epistemológicas e as simplificações desses trabalhos - ou de disputa intelectual, mas uma questão com urgência ética e política.

Ética porque toda atividade intelectual é uma prática social com efeitos sociais, políticos, culturais e econômicos específicos e interligados tanto aos enunciados teóricos, quanto a práxis propriamente dita. Portanto, exigente de responsabilidade, reflexividade e avaliação dos enunciados produzidos e das implicações – possíveis e efetivas – destes na sociedade, em geral, e na pesquisa científica, em particular. Questão política porque se trata também de denunciar e combater os efeitos de poder relativos à pesquisas do tipo mencionado: o mascaramento de posições normativas, preconceitos e de crenças morais que sob verniz da “pesquisa científica” e da neutralidade e objetividade dos resultados obtidos servem a determinados segmentos e visões de mundo em detrimento de outros.

Portanto, urge indagar: por quanto tempo, sociólogos, antropólogos, filósofos e historiadores assistirão passivos esses disparates que jogam à lata do lixo seus ofícios, história intelectual e trabalhos, contentando-se em responder tão somente por meio de conversas de corredor, exclamadas de indignação, por ironias em palestras e em aulas ou através de notas de rodapé publicadas em revistas e blogues? Será que já não é o momento de uma obra de fôlego, de um empreendimento consistente, rigoroso, em franco antagonismo com pesquisas desse tipo, reducionistas e biologizantes - e suas variações neuro-genética-psicológicas -, e que, sobretudo, reuna transdisciplinarmente as humanidades no sentido de levar suas contribuições, história e perspectiva crítica para públicos diversos?



Leia nos links abaixo, respectivamente, a reportagem sobre a pesquisa de Satoshi e o artigo do psicólogo evolutivo:

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Entrevista: A política pós-Lula, segundo Luiz Felipe de Alencastro.



Leia abaixo alguns dos principais trechos da lúcida e perspicaz entrevista dada pelo historiador e cientista político Luiz Felipe de Alencastro ao Valor Econômico a propósito da dinâmica política que se desenha para as eleições de outubro. Além do pleito, Luiz Felipe de Alencastro comenta a recepção ressentida e temerosa da classe média diante da ascensão social dos estratos mais pobres da população, o que, segundo o historiador, explica a aversão pouco refletida da classe média em relação governo Lula.

Valor: A revista "The Economist" fez uma matéria de capa sobre o Brasil, dizendo que o futuro chegou para o país do futuro. O sr. compartilha desse otimismo?

Luiz Felipe de Alencastro: Até a oposição compartilha desse otimismo. Dentro e fora do país há um consenso favorável sobre a economia brasileira, sobretudo com a entrada da China no mercado mundial, com uma forte demanda por matérias-primas. O lado negativo é que o comércio externo fica parecido com o que era no século XIX. Há um risco nessa divisão internacional do trabalho que vai se criando, em que o Brasil vira exportador de matérias-primas novamente.

Valor: E a perspectiva política?

Alencastro: O que me assusta é a ideia de ter Michel Temer como vice-presidente. Ele é deputado há décadas e foi presidente da Câmara duas vezes. Controla a máquina do PMDB e o Congresso à perfeição. Vai compor chapa com uma candidata que nunca teve mandato e é novata no PT. O presidencialismo pressupõe um vice discreto, porque ele é eleito de carona, para trazer alianças e palanques. Aos trancos e barrancos, instaurou-se um sistema presidencialista que tem dado certo no Brasil. O fato de haver dois turnos, associado à integração do vice na chapa do presidente, deu estabilidade ao sistema. Foi assim com Fernando Henrique e Marco Maciel. Foi assim com Lula e José de Alencar. Dilma e Temer formam uma combinação inédita: uma candidata até então sem mandato associada a um político cheio de mandatos e dono do PMDB, que é o maior partido do Brasil, mas nunca elegeu um presidente e vai com sede ao pote. O PMDB pode estabelecer um vice-presidencialismo, com um papel de protagonista que seria descabido.

Valor: Dilma é considerada uma administradora eficiente, mas não tem uma carreira política como a de Lula. Isso pode comprometer seu governo?

Alencastro: Ela assumiu a Casa Civil num momento difícil. O governo e o país estavam em crise e, por muito tempo, não se falou nela, o que é um indício de grande eficácia. Num cargo exposto como esse, não ser notícia é um grande feito. Isso prova que não é ficção sua fama de boa administradora. Mas acho problemático ela não ter a experiência de um mandato eletivo.

Valor: Lula, quando eleito, só tinha passado pela Assembleia Constituinte.

Alencastro: Mas era o fundador de um importante partido político e um grande líder sindical. O lado conciliador de Lula vem daí, da experiência de conversar no botequim com os companheiros, negociar com o patronato, avaliar relações de força na fábrica e na política. Se ele errasse, dirigindo uma greve furada, a sanção não seria perder um mandato, mas ter no dia seguinte dezenas de trabalhadores no olho da rua. Sem contar as campanhas, as três que perdeu para presidente e uma para governador de São Paulo, em 1982. Dilma foi secretária estadual no Rio Grande do Sul, um Estado muito politizado, mas isso não equivale a um cargo eletivo.

Valor: Serra, o sr. conhece melhor.

Alencastro: Serra tem muita experiência e é um grande líder. Mas tem um problema sério. Vou formulá-lo de maneira abrupta: e se Serra for um blefe? Explico: ele é apresentado desde 1982, quando foi secretário de Planejamento em São Paulo, como o reformador do Brasil, o homem que vai racionalizar a economia e dar jeito no país. Quando Fernando Henrique ganhou, ele foi ministro do Planejamento, mas ficou fora da política econômica. Como se dizia, Serra era o candidato da Fiesp, da indústria, e Fernando Henrique, da Febraban, dos banqueiros. Serra foi parar na Saúde e até hoje não quer ser associado àquela política econômica, de que era crítico acerbo.

Valor: A classe média também pode gerar instabilidade, ao sentir que perde privilégios?

Alencastro: Isso já está acontecendo. É o que alimenta a agressividade anti-Lula de certos jornais e revistas, que retratam a perplexidade de uma camada social insegura: os pobres estão satisfeitos e os ricaços também, mas a velha classe média não acha graça nenhuma. Ter doméstica com direito trabalhista, pobres e remediados comprando carro e atrapalhando o trânsito, não ter faculdade pública garantida para os filhos matriculados em escola particular. Tudo isso é resultado da mobilidade social, que provoca incompreensão e ressentimento numa parte da classe média. Daí o furor contra o ProUni, as cotas na universidade, o Bolsa Família. Leio a imprensa brasileira pela internet e às vezes fico pasmo com os comentários dos leitores, a agressividade e o preconceito social explícitos. O discurso de gente como o senador Demóstenes Torres no DEM [contra o sistema de cotas raciais nas universidades públicas] indica uma guinada à direita da direita parecida com a dos republicanos nos Estados Unidos. Lá, esse extremismo empolgou o partido inteiro e pode desestabilizar o país. A falta de perspectiva da oposição cria um vácuo para o radicalismo.

Valor: A oposição está desarticulada?

Alencastro: Desarticulada e sem discurso político coerente, e isso é ruim para o Brasil. Como ela vai se reorganizar? E vamos extrapolar: se perder São Paulo e o Rio Grande do Sul, acaba como força política nacional. Um desequilíbrio tamanho entre os partidos é problemático. Novamente, o exemplo americano: fico impressionado não só com o radicalismo, mas com a histeria. Obama é chamado de Anticristo... O Brasil pode enveredar por aí. Brasil e Estados Unidos são países conservadores e precisam ter um partido conservador à altura. A desarticulação da direita não é bom sinal. É preciso uma alternativa conservadora que mantenha a insatisfação no jogo eleitoral. Foi isso que o PT fez na esquerda. Ainda no tempo da ditadura, recolheu o sindicalismo apartidário, a franja próxima da luta armada, que tinha sido desmantelada, e a militância cristã, que não tinha onde se expressar eleitoralmente. Isso fez a força do PT.

Valor: A tendência, então, é Serra liderar uma direita radicalizada?

Alencastro: O problema é que, a princípio, Serra não é o candidato que a direita gostaria de ter. Ele é um democrata com trânsito numa parte da esquerda. Também é meio estatizante, adepto de uma política tarifária protecionista e por aí vai. Não é a mesma direita de Demóstenes Torres, Ronaldo Caiado ou mesmo Geraldo Alckmin. Por quê? Porque Serra teve a experiência da perseguição política, da ditadura, do exílio. Companheiros dele foram mortos, outros torturados. Isso até o aproxima de Dilma: os dois principais candidatos à presidência correram o risco de ser assassinados pela direita mais radical. Serra ainda escapou de Pinochet quando estava no Chile. De Paris, acompanhei com atenção sua volta ao Brasil em 1977, antes da anistia. Eduardo Kugelmas [sociólogo e cientista político, morto em 2006], quando soube que Serra tinha voltado sem ser preso, me disse: "Todo mundo pode voltar agora. Serra é um elefante de piranha. Se ele passou, todo mundo pode voltar". Hoje, o que torna sua candidatura difícil é não ter um discurso mais abrangente, além do anti-PT, para atrair outros setores.

Valor: A aliança possível para Serra seria talvez a direita radical, com que não se identifica. E sua adversária é uma esquerda que se aproximou das ideias que ele defendia...

Alencastro: Serra está confrontado a um impasse. Não pode elogiar Fernando Henrique e não pode atacar Lula. Que candidato ele pode ser? Qual é seu terreno? Ele pode ser um blefe nesse sentido. Na campanha, vai ter de prometer continuidade para os programas do PT. Quando Sérgio Guerra disse que o PSDB faria tudo diferente, foi um desastre. Disse que ia mexer no câmbio e nos juros. Falou disparates e levou um cala-boca do partido.

Valor: Isso pode fazer com que a campanha se torne virulenta?

Alencastro: Na blogosfera, já começou. É terrível, a começar pelo episódio da ficha policial falsa de Dilma. É um sinal do que está por vir. Vai ser um vale-tudo monumental. Embora o impacto disso seja limitado no grande eleitorado, é forte entre os chamados "formadores de opinião". Sobretudo, cria um clima de tensão e de irresponsabilidade na campanha presidencial.

Valor: A presidente da Associação Nacionais de Jornais, Judith Brito, disse que a fraqueza da oposição leva a imprensa a agir como partido. O que significa a imprensa se comportar como partido político?

Alencastro: Normalmente, a imprensa defende a Constituição, reformas políticas, ideias. Não há nada errado, por exemplo, em apoiar candidatos. O "New York Times" apoiou Obama, mas tem um trabalho jornalístico sério e equilibrado. Esse é o papel da imprensa, o que é diferente de querer substituir partidos políticos. Fiquei perplexo com o texto de uma coluna regular num grande jornal carioca que continha uma proposta partidária para o PSDB. O papel do jornalista não é redigir programas partidários.

Valor: O PT sofreu mutações desde que Lula foi eleito.

Alencastro: O aparelho, que se mexia sozinho, foi decapitado com a derrocada de [Luiz] Gushiken, [Antonio] Palocci e [José] Dirceu. Lula tomou conta e o partido perdeu sua independência. Tarso Genro disse que a candidatura Dilma cresceu no vazio que se criou dentro PT, e tem razão. O próprio Tarso, em 1997, foi pré-candidato contra Lula. Imagine se hoje isso seria possível! Existe um problema de sobrevivência para o PT pós-Lula. O movimento mais forte do Brasil no século XX, o varguismo, esgotou-se quando Lula foi para o segundo turno em 1989, batendo Brizola e puxando o eleitorado trabalhista. O PT também pode se desarticular porque perdeu o debate interno. Em 2005, com o escândalo do mensalão, Raul Pont propôs uma refundação do partido e enfrentou [Ricardo] Berzoini nas eleições internas. Perdeu, depois sumiu. Ninguém mais ouve falar nele, nem se sabe o que ele pensa. A ausência de debate interno pode transformar o PT num partido amorfo, corroído pelo empreguismo e o clientelismo político.

Valor: A política brasileira caminha para a fragmentação?

Alencastro: O que está acontecendo é a fagocitose das estratégias partidárias nacionais pela política estadual. É um efeito das reeleições nos Estados e nos municípios. Isso também coloca outros problemas. Seria necessário que os tribunais de contas estaduais e municipais fossem mais fortes, mais independentes - como o Tribunal de Contas da União - para escapar ao sobrepeso de um governador ou prefeito que é reeleito. As contas do Maluf, por exemplo, sempre foram aprovadas, e hoje ele está na lista vermelha da Interpol. Isso deveria levar a um questionamento maior no Brasil. Primeiro, nos partidos. Eles têm comissões de ética, mas abrigam eleitos acusados de diversos crimes. Depois, na imprensa, que deveria questionar tribunais de contas que aprovam o exercício de governadores e prefeitos delinquentes. Os editores deveriam pautar repórteres para recuperar os documentos, interrogar os membros desses tribunais. Como pode alguém ser perseguido pela Interpol, podendo ser preso em 181 países por causa disso, mas passar pelas regras da gestão pública brasileira?

Valor: A política externa brasileira tem recebido elogios no exterior, mas críticas pesadas no país. A que o sr. atribuiria essa disparidade?

Alencastro: Pela primeira vez, desde 1850, quando a marinha de guerra inglesa bloqueava a baía de Guanabara por causa do tráfico negreiro, a diplomacia brasileira entrou na agenda da campanha eleitoral nacional. Acho uma coisa muito boa. Durante a ditadura, política externa era um assunto secundário. Depois, com a internet, os jornais desistiram de ter sucursais e correspondentes no exterior. Ora, a política externa virou um assunto complexo, mas o Brasil não tem especialistas suficientes nos jornais ou nas universidades. A imprensa não segue política internacional de maneira adequada. Exige-se mais conhecimento específico dos jornalistas esportivos que de quem cobre o setor internacional. Há um quarteto de embaixadores aposentados que estão sempre na televisão, batendo em Celso Amorim e Lula. Repetem que a política externa é um desastre. Desastre? Os jornais americanos e europeus discordam. Nunca vi o Brasil com tanto prestígio. É até desproporcionado, dado o peso ínfimo do país no comércio internacional. Ao contrário da Índia e da China, potências atômicas com peso comercial enorme. Em maio, Lula vai ao Irã e está sendo criticado no Brasil. Já a "Economist" diz que é bom, porque abre novos canais de comunicação entre Estados Unidos e Irã. Nos últimos dias, a diplomacia brasileira usou com habilidade as regras da OMC e as manobras políticas para rebater o protecionismo americano na questão do comércio do algodão. Tenho certeza de que esse assunto, que começou em 2002 e ainda não terminou, ficará como um marco na história diplomática.

Por Diego Viana, para o Valor, de Paris09/04/2010.

Leia aqui a entrevista completa.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Tempos sombrios: a ignorância vaticana.



Se já não bastasse os recentes escândalos de pedofilia e o tratamento, como dizer, “misericordioso”, dado pelo Vaticano e o papa, os especuladores da vida eterna na figura do secretário de Estado do Vaticano, cardeal Tarcísio Bertone, numa conferência de imprensa em Santiago no Chile, passam agora, e sem nenhuma piedade, a violentar nossas inteligências com as ridículas e sombrias assertivas:

"Demonstraram muitos psicólogos, muitos psiquiatras, que não há relação entre celibato e pedofilia, mas muitos demonstraram - e disseram isso recentemente - que há uma relação entre homossexualidade e pedofilia", afirmou Bertone .

De acordo com o “número dois” do Vaticano, a origem do problema nos casos de abusos sexuais envolvendo membros da igreja deve-se à homossexualidade e não ao celibato! Mas espere leitor, ainda há mais. Respire um pouco e segure as gargalhadas por um instante. Bertone finaliza sua fala com este acréscimo: "Esta patologia toca todos os tipos de pessoas e os padres num grau menor, em termos percentuais".

O que dizer diante dessas "pérolas" da estupidez? Perdoai, Senhor, eles não sabem o que falam!

sábado, 10 de abril de 2010

"O fim da história do Brasil ou um novo começo para ela.".



Leia abaixo o artigo do Werneck Vianna, publicado no excelente site Gramsci e o Brasil, sobre a disputa presidencial que se avizinha. O artigo, como de costume, traz algumas cautelas necessárias e uma tanto quanto desencantadoras para os mais entusiasmados. Embora, a meu ver, Werneck Vianna negligencie alguns pontos importantes em sua análise sobre o PT, o posicionamento assumido pelo pesquisador coloca em suspeição o comodismo político presente naqueles que acreditam que, finalmente, o Brasil encontrou a "fórmula do sucesso". Nesse sentido, suas ressalvas abrem o entendimento para novas direções. Aproveitem!


A sucessão presidencial já está na linha do horizonte. Na superfície dos fatos, nenhuma indicação de que ela venha apontar para contrastes duros nos programas das candidaturas envolvidas na disputa, nem sinalizar para mudanças relevantes nos rumos da política. Afinal, o País conhece nestes quase 16 anos de governos paulistas do PSDB e do PT uma forte linha de continuidade em termos de política macroeconômica e de políticas sociais, e, entre as candidaturas concorrentes, duas delas, as mais credenciadas eleitoralmente, têm sua origem nesses partidos.

A continuidade na condução dessas políticas passou pelo teste severo da grande crise internacional, que abalou mercados e a própria economia capitalista, suportada pelo País sem maiores traumas. Passada a crise, consagrou-se, com razão, o diagnóstico de que seus piores efeitos teriam sido evitados graças aos “sólidos fundamentos da nossa economia” e do que seria o padrão de excelência vigente na regulação do nosso sistema financeiro, frutos, sem dúvida, de uma obra comum do PSDB e do PT, formatada e aperfeiçoada no curso dos seus governos.

Para essa impressão concorre também o estilo das duas principais candidaturas, Dilma Rousseff e José Serra, quadros com perfil forjado nas altas tarefas da administração pública, mais do que nos debates político-ideológicos. Nada surpreendente, portanto, que venham a ser, em boa medida, fiéis a esse estilo em suas campanhas eleitorais, impróprio, por sua natureza, às paixões. Vale dizer, nessa sucessão não se terá nem Jânio, nem Collor, nem Lula.

De modo mais geral, essa expectativa de uma disputa eleitoral destituída de agonística se alimenta, sobretudo, da difusa percepção de que os êxitos recentes na expansão do capitalismo brasileiro estariam a significar que a História do País, afinal, encontrou uma solução feliz. As conquistas econômicas e sociais teriam serenado o campo da política, cujas controvérsias girariam em torno de temas da administração e da gestão da coisa pública. Caberia, agora, escolher entre os candidatos o mais preparado para continuar o script consagrado no sentido do seu aprofundamento e, uma vez que o País já se acharia com suas instituições estabilizadas e assentado o seu caminho futuro, lançar-se na aventura da sua imposição no cenário internacional.

A marca forte desse script estaria no reconhecimento de que a tarefa imediata imposta pelas circunstâncias seria a de completar a longa revolução burguesa no País, cuja mais forte indicação estaria na penetração do moderno capitalismo no mundo agrário, sede tradicional dos protestos sociais mais virulentos, de caráter moderno ou não, contra o sistema da ordem da propriedade. O sucesso econômico do agronegócio, sua elevação à arena política constituída, em particular, no Norte e no Centro-Oeste do País, sua presença no governo — federal e de Estados — teriam removido de vez as tensões que antes ameaçavam o campo, como nos idos de 1960, com o fantasma da revolução.

Sob essa nova marcação da conjuntura, em que o tema agrário teria sido deslocado da sua antiga centralidade nos conflitos de classes no País, os trabalhadores urbanos estariam circunscritos a uma agenda de reformas, personagens plenos do moderno, restando incorporar ao sistema da ordem, por meio de políticas públicas, as grandes massas sujeitas, no campo e nas cidades, a trabalhos precários e intermitentes e a uma vida sem direitos. Posto nessa plataforma segura, caberia ao capitalismo brasileiro reestruturar-se, sob a liderança do Estado e de suas agências, num processo audacioso de concentração e de centralização de capitais, transitando para uma forma superior de organização.

No governo Lula, o impulso nessa direção foi intensificado, instituindo-se numa estratégia definida, principalmente, a partir da crise financeira mundial de 2008. Vencido seu teste de resistência sob condições extremas, o que era apenas um esboço, ainda um experimento de ensaio e erro, uma estratégia ainda inominada, ganha corpo e alma. O que vinha sendo uma navegação numa linha quase reta, na rota traçada pelos governos do PSDB e do PT, mudou o seu sentido e já percorre outro caminho.

Nessa reorientação, fixa-se para o capitalismo brasileiro o objetivo de transbordar suas fronteiras nacionais, num esforço conjunto do Estado e das grandes empresas de capital nacional, na tentativa de exercer uma vocação conquistadora de tipo grão-burguês. Outra característica está na abertura do repertório da tradição brasileira de Vargas a Geisel, recuperando a fórmula do nacional-desenvolvimentismo como via de uma modernização conduzida “por cima”.

Nessa operação, o Estado traz a sociedade para dentro de si, convertendo-se num “parlamento” onde se tomam as decisões a serem legitimadas por um Poder Legislativo enredado, por meio das práticas do chamado presidencialismo de coalizão, ao Executivo. Tal estratégia, audaciosa em seus fins, é conservadora quanto a seus meios: ela não procura a mobilização dos seres subalternos, salvo quando sob seu estrito controle, e se limita a procurar soluções institucionais, conceitos e motivações ideais no baú dos ossos da tradição autoritária brasileira.

Assim, ela é enérgica e criativa, quando se trata de perseguir os seus fins de uma ordem grão-burguesa, e passadista e conformista na política, como na sua patética mimetização do Estado Novo e da ressurgência que promove, em nome da realização de fins “substantivos” de justiça, da “democracia social”. Vista dessa perspectiva crítica, que recusa à nossa História o papel de prisioneiro passivo das fabulações que nos vêm do seu passado autoritário, a presente sucessão presidencial, longe do quietismo que tantos auguram para ela, pode datar um promissor recomeço.

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Luiz Werneck Vianna é professor-pesquisador do Iuperj, ex-presidente da Anpocs e membro do Departamento de Pesquisa Judiciária do Conselho Nacional de Justiça.

sexta-feira, 9 de abril de 2010

De um gênio para outro: Goethe sobre Shakespeare









“Não me lembro de nenhum outro livro, ser humano, nem de qualquer acontecimento da vida que tanta impressão me tenha causado quanto essas peças magníficas (...). Parecem obra de um gênio celestial, que se aproxima dos homens para lhes dar a conhecer a si mesmos da maneira mais natural. Não são composições poéticas! Acreditamos encontrar-nos diante dos colossais livros do destino em que, uma vez abertos, sibila o vento impetuoso da mais agitada vida, e com uma rapidez e violência vai virando suas páginas”.


Johann Wolfgang von Goethe. Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister. São Paulo: Ed. 34, 2006.


Eis aí um livro que, juntamente com Cartas a um jovem poeta de Rainer Maria Rilke, devemos sempre ler aos vinte anos. Ouso mais: existem livros que deveriam ser tratados como ritos de passagem obrigatórios à vida adulta. Os anos de aprendizagem de Wilhelm Meister de Goethe é um desses livros que golpeiam a alma e o entendimento, de tal forma que resulta difícil distinguir um do outro.

Como na maior parte dos “romances de formação” alemãs (Bildungsroman), o tema orbita pelas questões de como se tornar aquilo que se é: qual o sentido de nossa vida, a que ideal ou a quem dedicá-la, como exprimir nossa individualidade, isto é, nossas habilidades e virtudes com o máximo de força e estilo, como dá forma a este “espetáculo cheio de som e fúria” que é a vida ?

Tarefa árdua que passa, necessariamente, pela experiência do ser no mundo. Portanto, que tem a ver com colocar-se à prova segundo o compasso da vida e seu devir; os erros, desacertos, desvios, escolhas. Para aprender/descobrir o que somos é necessário mais do que apoderar-se, com violência e tenacidade, de si mesmo, converter este “si” ao mesmo tempo em sujeito e objeto de criação e cultivo, de um processo de formação que é conduzido em termos de experimentação com a exterioridade da vida - os acontecimentos, pessoas, circunstâncias e relações que compõem este acidente que é a vida de cada um nós.

Delineia-se no livro uma “quase pedagogia”, ou melhor, no dizer de Michel Foucault, uma estética da existência, que trata mais de como criar relações com nós mesmos – nossas forças, habilidades, virtudes e demônios - e com a vida – com os valores, relações e funções concernentes aos espaços nos quais estamos inseridos -, do que de um voltar-se para si, para dentro, uma pedagogia da escavação que busca o resíduo sobre o qual supostamente repousaria a verdade do que somos.

sábado, 3 de abril de 2010

Universal e particular: o que fazer com as burcas?



Passo agora para alguns breves comentários acerca do debate sobre a proibição ou não proibição da burca, tema da reportagem expressa no último post.

Quando os “outros” adentram em nossas fronteiras eles trazem inscritos em seus corpos e gestos as marcas de suas terras e sociedades. Carregam-na, mesmo a contragosto, para dentro de nosso mundo, e a exposição crua das diferenças que adentraram chacoalham nossas pressuposições. Um problema está claramente posto: o que fazer com essas diferenças? Tratá-las com reconhecimento na medida em que estão em consonância com nossos valores e normas e com repressão na medida em que afrontam/diferem destes últimos? Então é isto: devemos alçar nossa sociedade e desenho normativo como a medida de todas as coisas? Uma resposta etnocêntrica não está à altura do problema, pois repousa na própria normatividade das sociedades ocidentais modernas uma pretensão à universalidade e cosmopolitismo.

Uma atitude etnocêntrica é uma resposta particularista, portanto que contradiz a própria normatividade e identidade moderna. Então o problema passa a ser outro: como reconhecer/respeitar as especificidades dos de “fora”, dos “estrangeiros”, sem que isto implique na desagregação de nossas pressuposições normativas – laicidade, universalidade, isonomia, etc.? Ou, como preservar os princípios normativos abstratos modernos – cidadania, igualdade – sem que isto signifique subsumir ou negligenciar desigualdades/diferenças concretas? O que está em tensão é evidente: o conflito entre universal e particular, como conciliá-los?

Questões complicadas como pode perceber o leitor. Notadamente, como compreendeu Cadu, em seu comentário à reportagem referente ao debate sobre a burca, a Bélgica, e a também a França acompanhada por outros países da Europa ocidental, optou por uma política da universalidade, baseada na igualdade de todos os seres humanos em torno de certos princípios gerais e universalmente válidos, e que somente reconhece/tolera/permite determinadas diferenças e práticas culturais na medida em que estas estão em harmonia com aqueles princípios universalmente válidos e estendidos a todos.

No entanto, mais do que constatar a tensão entre universal e particular, é preciso perguntar o que anima e quem reivindica o manejamento de princípios universalistas como elementos de justificação à proibição do uso da burca em espaços públicos. Republicanismo ou islamofobia? Defesa de ideais democráticos e emancipadores ou medida populista para abocanhar votos nos extensos setores xenófobos e direitistas dos países europeus? A meu ver, a fronteira entre um e outro não é tão clara e definida. Além do mais, na Europa, o tema das burcas ou hijabs goza de uma atratividade político-midiática bastante forte.

Essa atitude do governo belga em insistir na proibição do uso em espaços públicos da burca denota a seguinte postura em relação às diferenças: “somente os aceitamos se vocês se tornarem, no espaço público – no espaço da circulação e exposição das diferenças e também o espaço das decisões – os mais próximos e iguais possíveis de nós”. Ou seja, a assimilação/reconhecimento somente se dá em função da aceitação/submissão pelos “estrangeiros” dos valores universais reguladores, que são, na verdade, valores europeus. Fora da norma e das fronteiras européias, os “estrangeiros”, as “mulheres de burca” continuam sendo “outros”. Estes só se tornam “iguais”, humanos em igualdade de direitos e dignidade, no espaço sancionado pela norma européia, ou melhor, mediante sua submissão a esta.

Um outro ponto recorrente na discussão sobre as burcas é a necessidade da emancipação das mulheres mulçumanas. De fato, a meu ver, a burca é um instrumento de sujeição, de controle do corpo feminino, ainda que brinde identidade, reconhecimento, pertencimento e beleza para algumas. Há aquelas, mulçumanas, que vêem na burca simultaneamente um prêmio, uma prova de obediência e uma forma de proteção de sua honra e modéstia, blindada do desejo masculino. Mas há também mulheres mulçumanas que encaram sua obrigatoriedade como imposição masculina, restrição, controle e disciplinamento.

Entretanto, se de fato o que interessa e move esse debate é a emancipação das mulheres, por que não se ver a mesma energia e dedicação política por parte dos interessados para equalização salarial entre homens e mulheres, ou sobre os efeitos nocivos das políticas de família estigmatizantes das mulheres/mães pobres, ou o abuso da publicidade na representação do corpo feminino que o reduz a um mero objeto? Quem é mais emancipada uma mulher mulçumana que trabalha, estuda e sustenta uma família ou as francesas “bon chic” a bater perna pela Champs-Élysées?

Sob o manto republicano da universalidade e emancipação existe muito de unilateralismo e dominação velados. Negar o acesso ao espaço público por razões de vestimentas ou religiosas me parece mais anti-republicano do que o uso das burcas.

A meu ver, políticas de controle e proibição, tais quais as expressas na reportagem, não enfrentam a principal questão, pois não há aprendizado, diálogo, enriquecimento mútuo, trocas e produção de reciprocidades de sentidos culturais através da confrontação de idéias, percepções e hábitos distintos. O conflito intercultural, o lidar com a diferença que perturba e chacoalha nossas pressuposições – e as dos outros também - e que as fazem se mostrar como aquilo que de fato são, isto é, como pontos de vistas particulares e provisórios, é deixado inteiramente de lado, suprimido em nome da segurança e reprodução de um modelo integrador e assimilacionista ilusoriamente universalista.

A questão a se enfrentar é: uma vez que vivemos num mundo globalizado onde o contato com as diferenças é inevitável, como produzir sentidos emancipadores mútuos através do conflito/diálogo intercultural mediante o qual as identidades, ou melhor, as identificações, valores e práticas culturais possam ser tratadas como realidades abertas, construídas e re-construídas historicamente, segundo a experiência sócio-política dos sujeitos? Um diálogo/conflito intercultural que não dispense um horizonte de pretensões universalistas de direitos – à dignidade, à igualdade e à liberdade, por exemplo -, mas que o inscreva no interior do movimento das discussões em torno das práticas e identificações culturais.

Que se interpele as mulheres mulçumanas com as seguintes questões: “por que somente às mulheres é colocado a obrigatoriedade de cobrir quase por completo o corpo?” “Quem decidiu e instituiu essa prática? Homens e mulheres em discussão? Ou somente os homens?” “Qual é o poder de decisão e interferência das mulheres nos assuntos religiosos?”

A cultura não é uma negociação de sentidos, como pensa o antropólogo americano Clifford Geertz, operada a partir de um consenso sobre as interpretações, mas sim, como pensam Nietzsche, Foucault e Bourdieu, o produto tenso e mais ou menos duradouro de um processo de imposição de sentidos arbitrários e apropriação de significados obtidos, impostos e conservados graças à diferença de força e relações de hegemonia e dominação específicas.

A grande dificuldade desse possível diálogo intercultural reside na mediação institucional, como formatá-lo institucionalmente. De todo modo, creio ser mais proveitoso políticas que ensejem uma crítica de mão dupla na tentativa de proporcionar um maior distanciamento e estranhamento aos indivíduos em relação à sua própria cultura e sociedade, discutindo as relações de poder e de hegemonia constituintes das identificações e práticas em questão, inclusive dessas políticas e do próprio diálogo/conflito intercultural – a desigualdade de capitais culturais e econômicos, a linguagem, gênero, etc.. A meta dessas políticas deve ser sempre a produção de efeitos de hibridização e complexificação recíprocos e potencialmente “mais democráticos” para os envolvidos.

Opinião: Não faz sentido proibir a burca.





Leia abaixo a reportagem do DER SPIEGEL sobre a polêmica Burca. Mais tarde, volto ao tema para tecer alguns comentários.


A Bélgica provavelmente proibirá as mulheres de vestirem a burca ou o niqab em público neste mês. Apesar da oposição ao véu islâmico ser compreensível nas sociedades democráticas ocidentais, proibi-lo não resolverá os problemas fundamentais de integração.

O Islã é basicamente aquilo em que os muçulmanos acreditam. Alguns acreditam que sua fé é perfeitamente compatível com cerveja. Outros acreditam que a única roupa adequada para uma mulher é a burca. A maioria dos muçulmanos se enquadra em um ponto intermediário entre esses dois extremos.

Se essas convicções religiosas se transformam em um problema depende do contexto social. No Afeganistão, a cerveja é um problema, mas a burca não. Na Bélgica, é o oposto. Há no momento uma ampla coalizão na Bélgica, incluindo verdes, liberais, democratas-cristãos, socialistas e a extrema direita, que quer impor uma proibição legal ao uso da burca e do véu que cobre o rosto chamado de niqab. Essa proibição seria aplicada por meio de multas ou até mesmo pena de prisão.

Uma proibição semelhante foi proposta na França e não causaria surpresa se o debate da burca logo se estendesse a outros países europeus, incluindo a Alemanha. E isso apesar de pouquíssimas mulheres que vivem no Ocidente usarem de fato a burca ou o niqab.

Impedindo a integração

Uma das ideias fundamentais da modernidade ocidental é o de que o mundo seria um lugar melhor se os países fossem mais parecidos com a Bélgica e menos como o Afeganistão. Homens e mulheres deveriam ser iguais, ninguém deveria ser excluído ou se sentir excluído, a religião deveria ser um assunto em grande parte privado. E os parlamentares belgas obviamente sentem que a burca e o niqab violam esses princípios fundamentais.

Isso é compreensível. Segundo esses padrões, a prática de tornar as mulheres –e nunca os homens– irreconhecíveis em público é uma provocação. E frequentemente há a suspeita de que algumas dessas mulheres são forçadas a vestir essas coberturas. Também pode ser presumido que as crianças nessas famílias não estão sendo criadas com ideias particularmente emancipadoras. Há certamente pouca dúvida de que esses véus atrapalham a integração.

Todavia, não faz sentido proibir a burca e o niqab. Essa proibição seria simplesmente atacar um sintoma, ignorando o problema real. Em questão não está o véu que cobre a cabeça, mas aquele que está dentro da cabeça.

Para qualquer mulher que é forçada a vestir a burca, uma proibição apenas asseguraria que ela não mais seria autorizada a sair de casa. Ninguém está seriamente sugerindo que ela teria um efeito instrutivo ou esclarecedor sobre o marido. E é arriscado especular que ela se sentiria apoiada por esta declaração legislativa.

Proibições não derrubam barreiras

Certamente é verdadeiro que as burcas parecem deslocadas na Europa. Afinal, a Europa representa a ideia de uma sociedade democrática, dinâmica e aberta. Quando parte da sociedade se remove (ou é removida) desses ideais, então isso é um problema.

Entretanto, proibições não tornam esses ideais mais claros ou mais palatáveis, não encorajam a participação e não derrubam barreiras. Elas fazem sentido quando envolvem ações concretas, como mutilação genital de meninas ou incitação à violência, nenhum dos quais são problemas exclusivamente muçulmanos.

Aqueles que gostariam de ver a burca e o niqab desaparecerem das ruas da Europa, entretanto, precisam procurar por outras soluções. A integração em uma sociedade aberta só pode ocorrer por meio de contato e troca. A frequência compulsória de crianças nas pré-escolas faria muito mais sentido, combinada com a obrigação por parte de ambos os pais de estarem presentes nos encontros de pais e mestres. E é melhor ir vestindo uma burca do que não ir.

A vantagem de propostas como estas é que não visam apenas as mulheres, nem apenas as famílias nas quais a mulher veste uma burca. Nem toda mulher vestindo uma burca ou um niqab se sente oprimida. E a prisão em que muitas mulheres muçulmanas sem dúvida vivem também pode ser invisível. Ela não é feita de tecido, mas de ideias.


Tradução: George El Khouri Andolfato


Retirado: http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/derspiegel/2010/04/03/opiniao-nao-faz-sentido-proibir-a-burca.jhtm