quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Entrevista: Luiz Werneck Vianna: "O PV sai como o novo partido nacional.".


Já que as eleições e o PV ocupam o topo da agenda do momento, então vamos a uma entrevista pelo sempre claro e preciso sociólogo Luiz Werneck Vianna, realizada pelo Instituto Humanitas Unisinos. Confiram!


IHU On-Line – No seu ponto de vista, o segundo turno para a presidência era esperado?

Werneck Vianna – Não, não era esperado. Todas as pesquisas balizavam outra direção e eu não tinha elementos para me contrapor a elas. Havia, sim, uma possibilidade remota, que se concretizou. Vamos ao segundo turno.

IHU On-Line – Quais são as forças políticas que saem fortalecidas e enfraquecidas deste primeiro turno?

Werneck Vianna – O PV foi muito forte, sai como o novo partido nacional. De modo que a tal polarização entre PSDB e PT está afastada. Além do mais, o PMDB está muito forte, com a possibilidade de, caso a Dilma vença, ter a vice-presidência. Então, é falsa a suposição de que teremos dois partidos. Temos um quadro pluripartidário bem estabelecido.

IHU On-Line – Como o senhor caracteriza o tipo de voto que Marina recebeu? O eleitor dela poderá ser conquistado com que tipo de discurso?

Werneck Vianna – Para conquistar o eleitorado do PV, será preciso um discurso de novo tipo. Depois do resultado das eleições, a Marina fez um pronunciamento em que marcou bem que estamos diante de uma política nova no país. E ela está certa quando fala do que chama de “política do século XXI”. Não é à toa que ela foi tão bem recebida especialmente pela juventude. Tem de tudo no voto dela, mas o voto juvenil é muito poderoso.

IHU On-Line – O que demonstra o fraco desempenho do DEM e do PSOL nessa campanha?

Werneck Vianna – Não creio que o PSOL tenha tido um fraco desempenho. Seu candidato a presidente da República teve um bom desempenho, marcou posição. E deu mais um passo para consolidar o PSOL. Ele não se esfarelou de modo algum, tem uma representação qualificada. Quanto ao DEM, será que ele foi extinto tendo ganho dois governos estaduais e uma representação congressual ainda presente, embora menor do que a anterior? Ele está aí, pronto para ressurgir em outros cenários eleitorais. Dilma e Serra eram candidatos muito fortes, tal como ficou claro. O PT ganhou uma expressão no Senado e no Congresso maior do que tinha, com governadores e uma candidata à presidência no segundo turno.
O que fica evidente é que essa campanha foi muito modorrenta, sem emoção, sem controvérsias. Os dois candidatos se parecem muito (Dilma e Serra) e foram também muito pautados pelos marqueteiros. Entre os dois o eleitor terá uma tendência maior em reiterar o voto na Dilma. Tudo vai depender de como a Marina, muito mais do que o PV, vai se situar. O processo está muito em aberto ainda. Qualquer previsão sobre quem ganhará é muito arriscada. O que já se sabia, e que começa a se reafirmar agora com mais força, é que vamos ter um cenário político sem a presença do Lula como maior protagonista. Isso é novo no país. Acredito que a personalidade do candidato importa muito. O Partido Verde não teria essa representação eleitoral não fossem as qualidades pessoais da Marina. Isso importa muito em uma eleição. Não é que ela tenha carisma; ela até tem um pouco. Mas não se trata disso. Ela tinha o que dizer, tinha uma proposta nova. Enquanto que Dilma e Serra são tão parecidos. Eu venho dizendo isso desde as primeiras entrevistas que dei a vocês. São candidatos com perfis semelhantes, dois excelentes administradores, mas que não têm a faísca da política, como tem o Lula e como tem a Marina, conforme se viu agora.

IHU On-Line – O senhor acredita que a política cedeu lugar para a administração? As pessoas hoje preferem votar em bons administradores ao invés de bons políticos?

Werneck Vianna – Não, não. A votação na Marina indica outra tendência. Serra tem uma história política muito poderosa. Foi secretário, deputado, ministro, senador, prefeito, governador. É uma história muito densa e sempre com êxito na administração pública. Dilma tem uma história menos densa, mais curta, mas também com uma trajetória de administradora bem sucedida, por exemplo, aí no Rio Grande do Sul, na Casa Civil e no Ministério de Minas e Energia. No entanto, os dois nessa eleição não conseguiram emocionar. As ruas estavam desertas, ao contrário de outros momentos da vida política brasileira, de outras sucessões presidenciais. Foi quase indiferente. Foi uma sucessão que, até então, transcorre sem uma controvérsia forte, que começa com um candidato da oposição botando no seu programa eleitoral o presidente da República, que é o chefe do partido da situação. Na verdade, Serra quis ganhar se apresentando como mais experiente na administração. Isso não foi suficiente. Chegou ao segundo turno não tanto pelas suas virtudes, mas pela irrupção da Marina.
IHU On-Line – Tiririca fez mais votos para deputado federal do que Plínio para presidente. Qual o significado desse dado e desse tipo de voto em um candidato como o Tiririca?
Werneck Vianna – Foi voto de protesto, de afastamento quanto ao processo eleitoral. O voto no Tiririca é um voto crítico. É como se o eleitor dissesse: “eu não tenho nada com isso, sou obrigado a votar, então escolho um candidato que representa uma nota sarcástica em relação a esse processo eleitoral”.

IHU On-Line – Por que o senhor acha que os programas de governo se tornaram secundários neste pleito?

Werneck Vianna – Porque o tema geral desse pleito foi a continuidade. Continuar os programas é algo que já está subentendido na prática de cada um, que é a necessidade de ter mais programa social, mais segurança e um elenco de questões com as quais os marqueteiros pautaram os candidatos. Qual o projeto de país, que país se quer viver, como se pensa a política, foram discussões que eles não colocaram. Só quem colocou isso foi a Marina. É evidente que ela colocou isso ainda de maneira muito superficial. O que ela entende de fato por democracia sustentável? Ela terá que traduzir isso. E também que política do século XXI é essa que ela alardeia? De qualquer forma ela tem uma semente. O que ela fará com isso vai depender dela em decisão conjunta com seus intelectuais, sendo alguns deles muito qualificados, como Luiz Eduardo Soares e Ricardo Paes de Barros, além de outros muito competentes que se alinharam com ela nessa campanha. Eles precisam, junto dela, decidir o que fazer com esse patrimônio que caiu no colo nessa sucessão. Fazer um partido duradouro, que fique na história política do país ou transformar este num momento fugaz, numa irrupção do tipo Heloísa Helena, em 2006? O PSDB está sem programa. Qual o programa do PT? É o lulismo. E o lulismo sem Lula é muito difícil de se sustentar. Nós continuamos tentando constituir um quadro partidário que acompanhe melhor as tendências modernas da sociedade brasileira. A esquerda está muito atrasada nisso, ainda vivenciando temas do passado. Mas o campo está aberto para a esquerda no país, desde que ela se renove politicamente e vá ao encontro da juventude, dos intelectuais, das questões novas, de uma política fundada na sociedade, na sua vida associativa. Estamos diante de uma paisagem promissora para que a novidade se expresse. O indicativo disso? A Marina. É claro que além dela há outras possibilidades. Cadê o tema da esquerda que tinha como questão principal a democracia política como valor universal? Isso sumiu. O PSOL não expressa isso, o PSTU passa longe disso. Só resta saber se esse campo aberto será ocupado.

 IHU On-Line – Como o senhor vê a participação da intelectualidade e dos movimentos sociais no debate político nacional?

Werneck Vianna – Os intelectuais estão meio à margem. Muito longe da expressão que tiveram em cenários anteriores. Foram dominados por uma agenda particular nas universidades, nessas agências de fomento à pesquisa (Capes, CNPq), e estão muito vinculados às agências estatais. Não sei se isso volta, mas se afastaram do mundo da opinião. Os movimentos sociais se deixaram estatatizar. Uma parte das ONGs que estão aí hoje tem vínculo com o Estado. No entanto, um fenômeno importante de manifestação da sociedade civil foi a Lei da Ficha Limpa. Mas estamos com uma sociedade civil muito desanimada. A política está saindo do nosso mundo. E ela vai voltar. Essas eleições são um indicador de que ela tem possibilidades de voltar.

Fonte: IHU

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