Entrevista realizada pelo jornalista Uirá Machado, da Folha de S. Paulo, cedida na integra ao sempre excelente sitio Gramsci e o Brasil. Jessé Souza é coordenador do Centro de Pesquisa sobre Desigualdade Social da Universidade Federal de Juiz de Fora e, com André Grillo e outros, lançou recentemente o livro A ralé brasileira: quem é e como vive (Belo Horizonte: Ed. UFMG), em que estuda as características dessa “parcela da população que vive como subgente”.
Diversos estudos mostram que a proporção de brasileiros vivendo abaixo da linha de miséria caiu 43% desde 2003. Em seu último livro, o senhor diz ser falsa a tese de que a desigualdade brasileira está desaparecendo. Por quê?
Em primeiro lugar há que se dizer que esses números são expressivos e refletem tanto o efeito do recente crescimento da economia brasileira, quanto, também, o sucesso inegável de diversas políticas sociais do atual governo. Os índices que demonstram recuo na miséria ou pobreza a partir de um patamar absoluto de renda, dizem, no entanto, apenas que a pobreza absoluta diminuiu. A desigualdade é um conceito relacional e diz respeito à distância — no nosso caso o abismo — entre as diversas classes sociais que disputam recursos escassos em uma sociedade dada. Existe aqui, portanto, o risco de que o “fetiche do número” encubra o principal.
O principal é que o Brasil é uma das sociedades complexas mais desiguais do planeta, porque entre 30% a 40% de sua população têm inserção precária tanto no mercado quanto na esfera pública. Existe toda uma “classe social”, nunca percebida enquanto tal no debate público — a não ser fragmentariamente enquanto temas soltos e sem relação entre si como “violência”, “desqualificação da mão de obra”, “insegurança pública”, “repetência escolar”, “criminalidade”, “transporte público”, “saúde pública”, etc. — que tende a reproduzir sua precariedade indefinidamente. Imaginam-se 500 problemas para não se ver o único problema efetivo que é a raiz e o núcleo de todos os outros. Fragmenta-se indevidamente a realidade e confundem-se as hierarquias das questões para não se ver o óbvio: que somos uma sociedade altamente conservadora e perversa que aceita conviver com uma porção significativa da sua população vivendo como “subgente”, com empregos precários e sem articulação política de seus interesses.
É esse fato, e não nenhum outro, o que verdadeiramente nos separa das sociedades política e moralmente mais avançadas do chamado “primeiro mundo”. Essa classe social, que chamamos provocativamente de “ralé”, num pais que eufemiza, nega e jamais discute seus conflitos de frente, é a mão de obra barata a serviço das classes média e alta que podem — contando com o exército de empregadas, faxineiras, moto-boys, porteiros, zeladores, carregadores, babás e prostitutas, para o serviço pesado e desvalorizado — se dedicar às ocupações rentáveis e com alto retorno em prestígio e reconhecimento. É isso que chamo de “desigualdade abissal” como nosso problema central. Os outros são “nuvens de fumaça” para que não se perceba o que é importante e o que hierarquicamente deveria vir primeiro.
O Bolsa Família é frequentemente apontado como um dos grandes trunfos do governo Lula. Qual sua avaliação sobre esse programa?
O bolsa família tem extraordinário impacto social, econômico e político, com investimento público relativamente muito baixo. É incrível que não se tenha pensado nisso antes. Mais incrível ainda que exista gente que é contra. Boa parte da dinamização do mercado interno brasileiro tem relação direta com o bolsa família, como tivemos ocasião de ver empiricamente em nossa última pesquisa, já no prelo, acerca da “nova classe média”, denominação, aliás, muito infeliz e que criticamos na pesquisa.
Por outro lado, o bolsa família não tem condições, sozinho, de reverter o quadro de desigualdade e “incluir” e “redimir” a “ralé” enquanto classe social precarizada em todas as dimensões. Esse é um desafio que tem que ser de toda a sociedade brasileira, que envolve processos de conscientização em todos os níveis. Muda-se uma sociedade quando esta “aprende coletivamente” e ascende a novos patamares de consciência moral e política, por exemplo, “se responsabilizando”, sem procurar bodes expiatórios fáceis, pelas mazelas sociais que produziu historicamente. Botar a culpa no Estado é fácil. Mas não existe ação estatal realmente efetiva sem conscientização social também efetiva e real.
Em A ralé brasileira, o senhor critica a visão da educação como panaceia para os males do país. Mas é justamente nessa área que o setor empresarial armou uma de suas mais fortes bandeiras, o “Todos pela Educação”. Trata-se de um equívoco de quem se engajou nessa campanha?
É claro que a educação é um fator fundamental para o progresso social em todas as dimensões. O problema é que a competição social não começa na escola. Ela começa em casa, no berço, na imitação e na identificação afetiva das crianças com quem elas amam. Se os pais ou figuras de referência são indivíduos de classe média ou alta, ou seja, indivíduos que aprenderam a ser disciplinados, autocontrolados e a verem o futuro como mais importante que o presente, vamos ter também certas virtudes de classe, como a que permite a “capacidade de concentração”, algo determinante no sucesso escolar e depois no mercado de trabalho.
A capacidade de se “concentrar”, vimos isso repetidas vezes na nossa pesquisa, não é “natural”. É um aprendizado de “classe”, de certas classes privilegiadas, privilégio este transmitido de modo afetivo e “invisível”. É um “privilégio de sangue”, na verdade, e não produto de qualquer “mérito individual”. De acordo com a própria justificação moral tanto do mercado quanto da sociedade modernas, fundada na pressuposição da “igualdade de oportunidades”, o que temos é toda uma classe social esquecida, abandonada e construída para servir, a baixo custo, com trabalho sujo e pesado, às necessidades das classes média e alta brasileiras que possuem privilégios sem igual na Europa e nos EUA. Sem que se considere que as crianças de classes sociais diversas chegam a escola como vencedoras ou como perdedoras já aos 5 ou 6 anos de idade, então o que iremos ter é a uma escola que só vai corroborar e oficializar o engodo do “mérito caído do céu” de uns e legitimar, com a autoridade do Estado e a anuência de toda a sociedade, o “estigma” dos outros.
É precisamente desse modo, que o abandono de uma sociedade perversa, que nunca se responsabilizou — nem quer se responsabilizar — pela miséria que ajudou a criar e a reproduzir, se transforma em “culpa individual” da própria vítima do abandono. É o pobre, que não teve a oportunidade de incorporar os pressupostos emocionais e sociais de qualquer processo de aprendizado, que se torna o “burro”, o “preguiçoso”, o “tolo”, em suma: o culpado do próprio destino. Existe melhor legitimação para a reprodução infinita de todos os privilégios?
A eleição presidencial deste ano está polarizada entre dois candidatos com um discurso gerencial. Para muitos, isso indica uma certa maturidade do país, que conseguiu consolidar suas instituições e agora precisa administrar sua economia. O senhor, contudo, critica duramente o discurso economicista. Por quê?
A pergunta enseja que nos perguntemos, em primeiro lugar, o que é “maturidade”. Maturidade, seja na dimensão individual ou coletiva, é a capacidade de perceber e de lidar com os inevitáveis conflitos e contradições da vida. Uma sociedade é madura quando ela olha de frente e sem medo para seus conflitos e contradições principais e aceita o desafio de resolvê-los. Reduzir e amesquinhar os conflitos sociais às questões técnicas de administração econômica é o contrário de maturidade.
Minha crítica ao que chamo de “discurso economicista” não é também uma negação da extraordinária importância da economia, nem muito menos uma crítica pessoal aos profissionais da economia. Minha crítica é à extraordinária pobreza de um debate público que reduz, distorce e amesquinha todas as questões e conflitos sociais aos imperativos da reprodução da economia. A inversão é patológica e reflete uma sociedade doente: ao invés do mercado ser pensado como servindo à sociedade, é a sociedade que é percebida como “insumo” do mercado. A penetração desse modo de pensar se dá de maneira, ao mesmo tempo, imperceptível e virulenta: terminamos por nos avaliar sempre pelo tamanho de nosso PIB e não pela forma que nos tratamos uns aos outros em sociedade.
O senhor afirma que o “mito da cordialidade brasileira”, de Gilberto Freyre, resulta numa “aversão a toda forma de explicitação de conflito e de crítica”. Lula foi um presidente que buscou evitar conflitos a todo custo, bem ao gosto de sua tradição sindicalista conciliadora, montando inclusive um governo de coalizão. Ele contribuiu para empobrecer o debate acadêmico e político?
Qualquer político tem de conciliar interesses contraditórios. Não existe fórmula prévia que possa definir de que modo e em que medida deve-se conciliar ou quando se deve partir para o enfrentamento. Apenas os resultados práticos que se alcançam pode nos dizer se, no caso, tratou-se de uma “boa conciliação”, que permitiu avanços sociais importantes, por exemplo, ou uma “má conciliação” que produziu resultados pífios.
Quando falei de “aversão ao conflito e a crítica” sequer pensei também numa crítica a Gilberto Freyre, que afinal criou um “conto de fadas para adultos” convincente — que é o que todo mito nacional na realidade é —, além de muito eficiente e com ampla penetração nacional. Não existe nada de mau nisso. Toda sociedade precisa de mitos que evoquem sentimentos de solidariedade e pertencimento coletivo.
Problemático é o que a inteligência nacional fez com esse mito. Nossa ciência social dominante — que influencia todo o debate público, dado que apenas a ciência possui a legitimidade para falar com autoridade sobre qualquer assunto de interesse público — se apropriou do mito “positivo” de Freyre e inverteu o sinal. Tudo o que era motivo de elogio para Freyre passa a ser negativo. Sérgio Buarque é o pioneiro dessa inversão especular de Freyre e, depois dele, praticamente todos os grandes intérpretes brasileiros desde então. Uma “cultura” emotiva e sentimental, antes elogiada, passa a ser percebida como índice de pré-modernidade. Ainda que os “homens cordiais” de Sérgio Buarque, indignos de confiança e “amigo dos próprios interesses”, sejam todos os brasileiros, pouco a pouco apenas o Estado será percebido como a “casa da cordialidade” que confunde o público e o privado. Por algum milagre, que ninguém explica, o mercado fica a salvo da “cordialidade” e de seus males. A “brasilidade cordial”, definida como emotiva e sentimental por oposição à racionalidade e ao cálculo, torna-se o problema maior do Brasil e passa a habitar apenas o Estado ineficiente, politiqueiro e corrupto, definindo o conceito mais importante das ciências sociais e do debate público brasileiro até hoje: o conceito de “patrimonialismo”.
O conceito de patrimonialismo distorce e simplifica a realidade de várias maneiras, mas, sempre, na mesma direção: o mercado é percebido como a esfera idealizada de todas as virtudes e o Estado como a esfera que encerra todo o mal e toda a corrupção. Na verdade é um absurdo separar mercado e Estado, que são realidades interdependentes e um não existe sem o outro, e mais absurdo ainda imaginar que não exista corrupção também no mercado — e isso no mundo inteiro — não existindo qualquer privilégio “patrimonialista” brasileiro nessa questão. A última crise financeira e as sucessivas crises provocadas por balanços “maquiados” de empresas e de países inteiros — como no caso recente da Grécia — apenas deixam essa questão clara como a luz do sol. Como sempre o pior cego é aquele que não quer ver.
A verdadeira função deste “conceito” é dramatizar um falso conflito — entre mercado e Estado —, de modo a esconder todos os reais conflitos que nunca chegam sequer a atingir o patamar de tema digno de ser discutido, como precisamente no caso da reprodução indefinida de uma “ralé” de indivíduos precarizados por abandono e descuido. Os falsos conflitos estão sempre no lugar de conflitos reais. A dramatização de um conflito superficial e falso serve para que os conflitos que cindem a sociedade brasileira de fio a pavio sequer sejam percebidos como problema. É assim que se constrói uma sociedade perversa e conservadora que ainda se imagina “crítica” e “moralmente indignada”.
O senhor tem argumentado que o conceito de classes sociais não pode se limitar à questão da renda e que apenas uma nova compreensão das classes sociais poderia levar o país a combater de fato a desigualdade. Como isso se daria?
A redução das classes sociais ao seu substrato apenas econômico, seja à renda ou ao lugar na produção, erro comum tanto ao liberalismo dominante quanto ao marxismo enrijecido dominado, implica “falar” de classes sociais sem que nada se compreenda de sua importância. Percebem-se apenas os aspectos “materiais” como dinheiro ou transmissão de propriedade, e se “esquece” da transmissão de “valores imateriais”, como as formas específicas de agir e reagir no mundo, os quais, esses sim, constituem os indivíduos como indivíduos de classe.
São os valores e as disposições para o comportamento individual incutidos desde a mais tenra infância na socialização familiar típica de cada classe que criam os privilégios positivos de um lado e negativos de outro. Como regra, as virtudes são todas do “espírito”, como a inteligência, o cálculo, a razão distanciada, ou até o “expressivismo blasé”; já os vícios, por outro lado, são todos ligados ao “corpo”, como a sexualidade sem controle, os afetos, a emotividade, a força muscular, etc. As classes superiores “in-corporam” — literalmente tornam “corpo”, automático, como quem anda ou respira — as virtudes espirituais como a capacidade de concentração, por exemplo, decisiva no sucesso escolar. As classes inferiores “in-corporam” as virtudes ambíguas do corpo, assim como todos os outros dominados como as mulheres — por oposição ao homem — e o negro — por oposição ao branco.
Em todas as dimensões da competição social por recursos escassos de todo tipo, no entanto, são as virtudes do espírito aquelas que recebem bons salários, prestígio e reconhecimento social. As classes do “corpo” tendem a ser literalmente “animalizadas”, podendo ser usadas e instrumentalizadas e até mortas por policiais sem que ninguém se comova com isso. O fato é que existem sociedades — que aprenderam a enfrentar seus desafios de frente — que reduziram o percentual de classes excluídas e animalizadas a um mínimo. Penso aqui nas principais democracias europeias. Nós escolhemos nos indignar moralmente com falsos conflitos e negar patologicamente qualquer responsabilidade social pela miséria econômica, existencial e política de parte considerável de nossa população.
A “meritocracia” está em larga medida consolidada nas sociedades contemporâneas, mas o senhor diz ser falsa a ideia de que o desempenho é o fator diferencial entre os indivíduos. Por quê? E qual a alternativa?
O problema não é com a idéia do “desempenho diferencial” como fundamento do mérito individual. O problema é o “esquecimento” de que todo “mérito individual” é socialmente construído. Isso tem a ver com o “esquecimento” também das heranças imateriais, emotiva e afetivamente transmitidas, que compõem as diversas classes sociais. A sociedade constrói — pelo “privilégio de sangue”, ou seja, pela sorte de se nascer na “família certa” — indivíduos destinados ao sucesso e ao “mérito”, que são os indivíduos aos quais são transmitidos os pressupostos emotivos, afetivos e morais que garantem o sucesso na escola e depois no mercado capitalista, e outros indivíduos destinados ao fracasso e ao não-mérito, ou seja, ao “estigma”, por não terem tido a mesma chance e por terem nascido na “família errada”, ou seja, por exemplo, numa família da “ralé”.
Qual a “justiça” que há nisso? Esse argumento atinge o coração da legitimação social de qualquer sociedade moderna, posto que as sociedades modernas nasceram e se legitimaram, em oposição a todas as formas pré-modernas de sociabilidade, precisamente pela idéia da superação de todo “privilégio de sangue”, ou seja, pela pressuposição da superação de todo privilegio de origem familiar. A reprodução da legitimidade no tempo de toda sociedade moderna depende também da manutenção dessa ilusão. Transferir a culpa social para o próprio indivíduo, como acontece com os membros de nossa “ralé”, que se imaginam efetivamente “burros” e incapazes de aprender, é parte fundamental dessa estratégia de distorcer a realidade para a manutenção indefinida de privilégios nada meritocráticos.
O governo Lula contribuiu em alguma medida para reduzir essa desigualdade abissal a que o senhor se refere? E o governo FHC?
As sociedades que conseguiram superar efetivamente, em medida significativa pelo menos, a separação entre gente e subgente e entre cidadão e subcidadão o fizeram como esforço de toda a sociedade e não apenas do Estado. O Estado não é um ente todo poderoso que possa atuar, com sucesso, contra consensos sociais arraigados. Houve avanços inegáveis nas últimas décadas como o ganho de racionalidade econômica no período FHC e a tentativa bem sucedida, ainda que incompleta, de repor a questão social como a questão central brasileira no período Lula. Mas o futuro pode ser mais audacioso. O crescimento econômico continuado e a descoberta de novas riquezas podem ser mecanismos importantes para redefinir e transformar o padrão excludente de sociedade que tem sido o único que conhecemos. Mas a mudança social é muito mais do que condições econômicas favoráveis. Elas exigem pensar o Brasil de modo novo. Um Brasil que encare seus conflitos de frente sem muletas fáceis do tipo “Estado patrimonial”.
O senhor diria que os dois principais candidatos empobrecem a discussão ao reproduzir um discurso gerencial de viés economicista?
Existe um aspecto “gerencial” que é perfeitamente legítimo e como tal ele enriquece o debate político. Há que se usar bem os recursos disponíveis e esse tipo de “racionalidade técnica” é indispensável. Mas a racionalidade técnica é um “meio” não é um “fim”. A questão relevante é sempre para que ou para quem serve a racionalidade técnica? Quando se fala da racionalidade técnica como um fim em si é porque não se pode nomear para quem ou para que ela serve.
Quando o senhor diz que ainda existem privilégios de sangue, parece que a Queda da Bastilha não ressoou por aqui. É isso mesmo? Nossa sociedade é medieval desse ponto de vista?
Os privilégios de sangue são, na realidade, privilégios de classe já que a reprodução emotiva e sentimental das classes se dá no seio das famílias que são, por sua vez, formatadas de acordo com uma herança de classe muito específica. Todas as sociedades modernas procuram esconder o pertencimento de classe posto que só ele pode esclarecer a origem de todos os privilégios que se reproduzem no tempo. As sociedades modernas, todas elas, têm que se apresentar como “sociedades de indivíduos”, se possível sem passado e sem vínculos sociais e comunitários. A imensa maioria dos filmes, novelas, livros de grande venda e propagandas de todo tipo reforçam essa ilusão. O “esquecimento” do vínculo que liga os indivíduos a classes sociais determinadas é, em qualquer sociedade moderna, o maior segredo da dominação social porque permite que os privilégios sejam percebidos como “mérito individual” e, sejam, portanto, justificados.
Mas as sociedades não são iguais. Existem sociedades politicamente e moralmente mais avançadas do que a nossa porque foram sociedades que aprenderam a conviver e a institucionalizar o conflito social ao invés de negá-lo patologicamente como fazemos. Nessas sociedades existem também canais alternativos para idéias e concepções alternativas. Mas nós também podemos aprender. O que foi feito pelo homem pode ser refeito por ele. Perceber o mundo como contingente e possível de ser modificado — e não como “natural” e como o único possível — é sempre o melhor começo.
Fonte: Gramsci e o Brasil
As falas sempre ácidas de Jessé provocam boas reflexoes acerca da natureza de classe na nossa sociedade e na nossa desigualdade social, tudo isso com as lentes da sociologia. O que prejudica sua sofistacada análise, no meu entender, é insistir na oposicao entre "sociedades política e moralmente superiores" (centro) e sociedades periféricas. Tratar a condicao de desenvolvimento das sociedades centrais como o produto de aprendizado moral é um grave erro analítico que persiste por conta da incorporacao da teoria moral de Taylor sem a submetê-la a uma reconversao sociológica. No fim das contas, Jessé acaba justificando a auto-imagem positiva dos intelectuais europeus acerca da sua pretensa superioridade cultural e moral.
ResponderExcluirSeguramente, Jessé desenvolve uma das mais sofisticadas e densas interpretações, com uma criatividade teórica singular, sobre o Brasil e a questão da desigualdade, articulando, fundamentalmente, autores como Bourdieu, Habermas e Taylor. Pergunto-me se a oposição ou hierarquia que vc destaca como um elemento de reificação ou que, em certa medida, embarga a análise de Jessé não seja, talvez, precisamente o produto do desenvolvimento desigual daquelas disposições requeridas, nos quadros societários modernos e capitalistas, para competição socio-simbólica que caracteriza esses últimos. Nesse sentido, talvez, essa oposição é inevitavel - o problema reside no grau dado a essa oposição.
ResponderExcluirA meu ver, a justificação da auto-imagem atribuída pelos europeus sobre si mesmos seria, desse ponto de vista, mais uma consequencia não-intencional dos aspectos teoricos-metodológicos destacados e mobilizados por Jessé do que uma reificação ou erro analítico.
De todo modo, em linhas gerais, como vc pensaria ou operaria essa "reconversão sociológica" da teorial moral de taylor dentro do quadro de referencia do Jessé tendo em mira a resolução da oposição que vc apontou?
Boa colocacao! Vamos lá,
ResponderExcluirEm primeiro lugar, perceber que existe uma diferenca na taxa média de distribuicao desigual das disposicoes adquiridas entre sociedades centrais e periféricas nao é “condicao suficiente” para estabelecer uma relacao de causalidade direta com a imagem de aprendizado moral ou "consenso intersubjetivo" de uma determinada nacao. Tratar nesses termos é desconsiderar outras variáveis pertinentes à análise. Como por exemplo, a existência do Estado de bem-estar, este muito mais o resultado de consequências nao-intencionais da acao do que o produto de um aprendizado moral. Um outro aspecto discutível é a forma de articulacao que operada entre Taylor e Bourdieu, sem o devido cuidado. Vejamos bem, Jessé quando destaca as afinidades entre Taylor e Bourdieu, costuma recorrer ao próprio Taylor quando este, assim como Bourdieu, se serve de Wittgenstein para pensar como a questao da moral na prática. E, de fato, tanto Bourdieu quanto Taylor se servem do postulado wittgensteiniano do “conhecimento na prática”. Porém, o grande diferencial entre a maneira como os dois se servem de Wittgenstein está justamente na transferência do postulado. Taylor faz a transferência direta, sem nenhum outro ajuste, para pensar a moralidade objetiva enquanto elemento que guia a acao prática. Bourdieu, por sua vez, opera dois movimentos analíticos fundamentais: de um lado, acrescenta ao postulado wittgesteiniano da “cultura na prática” o vinculo institucional (Estado, mercado, família, escola, etc.); de outro lado, acrescenta o vínculo de classe (esquemas de pensamento distribuidos e adquiridos de maneira desigual). Ora, como se sabe, Wittgenstein nao estava preocupado em problematizar as condicoes objetivas desiguais em que se processa o uso da linguagem na prática, muito menos as variacoes sócio-históricas. Isso nao é desmerito, afinal, ele fazendo filosofia da linguagem. Da mesma maneira, Taylor nao está preocupado em fazer sociologia quando refletiu sobre a característica da identidade moral moderna; nao somente, o mesmo confessa explicitamente suas intencoes e lacunas existentes nesse tipo de análise. O problema está em insistir no pressuposto do “consenso intersubjetivo” quando na verdade, o consenso ou o aprendizado moral nao é a “causa”, mas o “efeito” de lutas objetivas semânticas passadas. Lutas semânticas que sao a traducao de lutas pelo poder entre classes de agentes em diferentes momentos da história das sociedades ocidentais.
Continuacao
ResponderExcluirComo ilustracao empírica, recomendo a leitura da análise de Norbert Elias sobre como se impoe e universaliza os ideais humanistas depois de uma longa luta entre humanistas e nacionalistas. Aqui, Elias demonstra como o que entendemos e aceitamos “consensualmente” hoje enquanto cultura humanista é na verdade um código moral de uma intelligentsia de classe média alema insastifeita com a sua condicao social no sistema de poder da Alemanha do século XIX. No que se refere a Taylor, seu erro está em tematizar apenas as formas de "articulacao" das categorias de pensamento a fim de restituir seu sentido moral, descurando totalmente da "lógica prática" dessas mesmas categorias, tal como fez Bourdieu. Existem outros sérios problemas em Taylor que vao se reproduzir na teoria de Jessé, mas isso eu realmente nao pretendo expor. Nao agora e muito menos nesse lugar. Ademais, é um grande sociólogo, sem dúvida, e eu estou aberto a contra-argumentacoes.
abracao
Só mais uma notinha,
ResponderExcluirA oposicao hieraquica entre corpo e mente nao tem origem, nem muito menos foi articulada pela primeira vez por Platao, tal como assinala Taylor. Essa distincao qualitativa entre corpo e mente já existia, inclusive na forma articulada, no "pensamento selvagem" e nas "religioes primitivas", algo que tanto Emile Durkheim quanto Max Weber perceberam. E além de ser uma distincao moral, era também uma distincao "lógica".
"O problema está em insistir no pressuposto do “consenso intersubjetivo” quando na verdade, o consenso ou o aprendizado moral nao é a “causa”, mas o “efeito” de lutas objetivas semânticas passadas. Lutas semânticas que sao a traducao de lutas pelo poder entre classes de agentes em diferentes momentos da história das sociedades ocidentais".
ResponderExcluirPor esse trecho, em vez de Kant, Taylor deveria ter lido mais atentamente Nietzsche, particularmente, Genealogia da moral. Sem dúvida, Bourdieu é bem mais sensivel ao papel da luta em torno da definição, criação e apropriação de ideais do que Taylor.
Quanto ao Jessé, ainda, minhas ressalvas se dirigem também em relação ao lugar e a atenção dada a agencia das classes populares ou ralé. Estas são costumeiramente pensadas em termos de sua subordinação às classes dominantes, isto é, segundo suas deficiências e incapacidades em relação a algum tipo de capital - o cultural, por exemplo. De maneira que é precisamente a dominação, ou melhor, a negatividade em relação a certas caracteristicas distintivas que determina, em sua totalidade, essas classes. Isso é muito claro nos trabalhos de Bourdieu, e, creio, que Jessé cai no mesmo.
A meu ver, a unilateralidade desse tipo de apreensão que enfatiza demasiadamente e objetiva analiticamente através do negativo, das limitações, das incapacidades etc., acaba por abafar os meios práticos e simbolicos por meio dos quais as classes populares, a um só tempo, experimentam a supeficie vivenciada da vida social e agem criativamente sobre e através das constrições estruturais nas quais estão enredadas. Por mais pesado e sufocante que sejam os limites e condicionamentos há sempre o espaço do improviso onde se plasmam os desejos, as intenções, as valorações provocadas pelo efeito de situações especificas e imprevistas.
Abraços,
"O problema está em insistir no pressuposto do “consenso intersubjetivo” quando na verdade, o consenso ou o aprendizado moral nao é a “causa”, mas o “efeito” de lutas objetivas semânticas passadas. Lutas semânticas que sao a traducao de lutas pelo poder entre classes de agentes em diferentes momentos da história das sociedades ocidentais".
ResponderExcluirPor esse trecho, em vez de Kant, Taylor deveria ter lido mais atentamente Nietzsche, particularmente, Genealogia da moral. Sem dúvida, Bourdieu é bem mais sensivel ao papel da luta em torno da definição, criação e apropriação de ideais do que Taylor, o que lhe permite desenvolver uma perspectiva sobre o mundo social mais plural e tensa e menos essencialista e coerente.
Quanto ao Jessé, ainda, minhas ressalvas se dirigem também em relação ao lugar e a atenção dada a agencia das classes populares ou ralé. Estas são costumeiramente pensadas em termos de sua subordinação às classes dominantes, isto é, segundo suas deficiências e incapacidades em relação a algum tipo de capital - o cultural, por exemplo. De maneira que é precisamente a dominação, ou melhor, a negatividade em relação a certas caracteristicas distintivas que determina, em sua totalidade, essas classes. Isso é muito claro nos trabalhos de Bourdieu, e, creio, que Jessé cai no mesmo.
A meu ver, a unilateralidade desse tipo de apreensão que enfatiza demasiadamente e objetiva analiticamente através do negativo, das limitações, das incapacidades etc., acaba por abafar os meios práticos e simbolicos por meio dos quais as classes populares, a um só tempo, experimentam a supeficie vivenciada da vida social e agem criativamente sobre e através das constrições estruturais nas quais estão enredadas. Por mais pesado e sufocante que sejam os limites e condicionamentos há sempre o espaço do improviso onde se plasmam os desejos, as intenções, as valorações provocadas pelo efeito de situações especificas e imprevistas.
Abraços,
"O problema está em insistir no pressuposto do “consenso intersubjetivo” quando na verdade, o consenso ou o aprendizado moral nao é a “causa”, mas o “efeito” de lutas objetivas semânticas passadas. Lutas semânticas que sao a traducao de lutas pelo poder entre classes de agentes em diferentes momentos da história das sociedades ocidentais".
ResponderExcluirPor esse trecho, em vez de Kant, Taylor deveria ter lido mais atentamente Nietzsche, particularmente, Genealogia da moral. Sem dúvida, Bourdieu é bem mais sensivel ao papel da luta em torno da definição, criação e apropriação de ideais do que Taylor.
Quanto ao Jessé, ainda, minhas ressalvas se dirigem também em relação ao lugar e a atenção dada a agencia das classes populares ou ralé. Estas são costumeiramente pensadas em termos de sua subordinação às classes dominantes, isto é, segundo suas deficiências e incapacidades em relação a algum tipo de capital - o cultural, por exemplo. De maneira que é precisamente a dominação, ou melhor, a negatividade em relação a certas caracteristicas distintivas que determina, em sua totalidade, essas classes. Isso é muito claro nos trabalhos de Bourdieu, e, creio, que Jessé cai no mesmo.
A meu ver, a unilateralidade desse tipo de apreensão que enfatiza demasiadamente e objetiva analiticamente através do negativo, das limitações, das incapacidades etc., acaba por abafar os meios práticos e simbolicos por meio dos quais as classes populares, a um só tempo, experimentam a supeficie vivenciada da vida social e agem criativamente sobre e através das constrições estruturais nas quais estão enredadas. Por mais pesado e sufocante que sejam os limites e condicionamentos há sempre o espaço do improviso onde se plasmam os desejos, as intenções, as valorações provocadas pelo efeito de situações especificas e imprevistas.
Abraços,
"O problema está em insistir no pressuposto do “consenso intersubjetivo” quando na verdade, o consenso ou o aprendizado moral nao é a “causa”, mas o “efeito” de lutas objetivas semânticas passadas. Lutas semânticas que sao a traducao de lutas pelo poder entre classes de agentes em diferentes momentos da história das sociedades ocidentais".
ResponderExcluirPor esse trecho, em vez de Kant, Taylor deveria ter lido mais atentamente Nietzsche, particularmente, Genealogia da moral. Sem dúvida, Bourdieu é bem mais sensivel ao papel da luta em torno da definição, criação e apropriação de ideais do que Taylor.
Quanto ao Jessé, ainda, minhas ressalvas se dirigem também em relação ao lugar e a atenção dada a agencia das classes populares ou ralé. Estas são costumeiramente pensadas em termos de sua subordinação às classes dominantes, isto é, segundo suas deficiências e incapacidades em relação a algum tipo de capital - o cultural, por exemplo. De maneira que é precisamente a dominação, ou melhor, a negatividade em relação a certas caracteristicas distintivas que determina, em sua totalidade, essas classes. Isso é muito claro nos trabalhos de Bourdieu, e, creio, que Jessé cai no mesmo.
A meu ver, a unilateralidade desse tipo de apreensão que enfatiza demasiadamente e objetiva analiticamente através do negativo, das limitações, das incapacidades etc., acaba por abafar os meios práticos e simbolicos por meio dos quais as classes populares, a um só tempo, experimentam a supeficie vivenciada da vida social e agem criativamente sobre e através das constrições estruturais nas quais estão enredadas. Por mais pesado e sufocante que sejam os limites e condicionamentos há sempre o espaço do improviso onde se plasmam os desejos, as intenções, as valorações provocadas pelo efeito de situações especificas e imprevistas.
Abraços,
"O problema está em insistir no pressuposto do “consenso intersubjetivo” quando na verdade, o consenso ou o aprendizado moral não é a “causa”, mas o “efeito” de lutas objetivas semânticas passadas. Lutas semânticas que são a tradução de lutas pelo poder entre classes de agentes em diferentes momentos da história das sociedades ocidentais".
ResponderExcluirPor esse trecho, em vez de Kant, Taylor deveria ter lido mais atentamente Nietzsche, particularmente, Genealogia da moral. Sem dúvida, Bourdieu é bem mais sensível ao papel da luta em torno da definição, criação e apropriação de ideais do que Taylor.
Quanto ao Jessé, ainda, minhas ressalvas se dirigem também em relação ao lugar e a atenção dada a agencia das classes populares ou ralé. Estas são costumeiramente pensadas em termos de sua subordinação às classes dominantes, isto é, segundo suas deficiências e incapacidades em relação a algum tipo de capital - o cultural, por exemplo. De maneira que é precisamente a dominação, ou melhor, a negatividade em relação a certas características distintivas que determina, em sua totalidade, essas classes. Isso é muito claro nos trabalhos de Bourdieu, e, creio, que Jessé cai no mesmo.
A meu ver, a unilateralidade desse tipo de apreensão que enfatiza demasiadamente e objetiva analiticamente através do negativo, das limitações, das incapacidades etc., acaba por abafar os meios práticos e simbólicos por meio dos quais as classes populares, a um só tempo, experimentam a superfície vivenciada da vida social e agem criativamente sobre e através das constrições estruturais nas quais estão enredadas. Por mais pesado e sufocante que sejam os limites e condicionamentos há sempre o espaço do improviso onde se plasmam os desejos, as intenções, as valorações provocadas pelo efeito de situações específicas e imprevistas.
Abraços,
"O problema está em insistir no pressuposto do “consenso intersubjetivo” quando na verdade, o consenso ou o aprendizado moral não é a “causa”, mas o “efeito” de lutas objetivas semânticas passadas. Lutas semânticas que são a tradução de lutas pelo poder entre classes de agentes em diferentes momentos da história das sociedades ocidentais".
ResponderExcluirPor esse trecho, em vez de Kant, Taylor deveria ter lido mais atentamente Nietzsche, particularmente, Genealogia da moral. Sem dúvida, Bourdieu é bem mais sensível ao papel da luta em torno da definição, criação e apropriação de ideais do que Taylor.
Quanto ao Jessé, ainda, minhas ressalvas se dirigem também em relação ao lugar e a atenção dada a agencia das classes populares ou ralé. Estas são costumeiramente pensadas em termos de sua subordinação às classes dominantes, isto é, segundo suas deficiências e incapacidades em relação a algum tipo de capital - o cultural, por exemplo. De maneira que é precisamente a dominação, ou melhor, a negatividade em relação a certas características distintivas que determina, em sua totalidade, essas classes. Isso é muito claro nos trabalhos de Bourdieu, e, creio, que Jessé cai no mesmo.
A meu ver, a unilateralidade desse tipo de apreensão que enfatiza demasiadamente e objetiva analiticamente através do negativo, das limitações, das incapacidades etc., acaba por abafar os meios práticos e simbólicos por meio dos quais as classes populares, a um só tempo, experimentam a superfície vivenciada da vida social e agem criativamente sobre e através das constrições estruturais nas quais estão enredadas. Por mais pesado e sufocante que sejam os limites e condicionamentos há sempre o espaço do improviso onde se plasmam os desejos, as intenções, as valorações provocadas pelo efeito de situações específicas e imprevistas.
Abraços,
"O problema está em insistir no pressuposto do “consenso intersubjetivo” quando na verdade, o consenso ou o aprendizado moral não é a “causa”, mas o “efeito” de lutas objetivas semânticas passadas. Lutas semânticas que são a tradução de lutas pelo poder entre classes de agentes em diferentes momentos da história das sociedades ocidentais".
ResponderExcluirPor esse trecho, em vez de Kant, Taylor deveria ter lido mais atentamente Nietzsche, particularmente, Genealogia da moral. Sem dúvida, Bourdieu é bem mais sensível ao papel da luta em torno da definição, criação e apropriação de ideais do que Taylor.
Quanto ao Jessé, ainda, minhas ressalvas se dirigem também em relação ao lugar e a atenção dada a agencia das classes populares ou ralé. Estas são costumeiramente pensadas em termos de sua subordinação às classes dominantes, isto é, segundo suas deficiências e incapacidades em relação a algum tipo de capital - o cultural, por exemplo. De maneira que é precisamente a dominação, ou melhor, a negatividade em relação a certas características distintivas que determina, em sua totalidade, essas classes. Isso é muito claro nos trabalhos de Bourdieu, e, creio, que Jessé cai no mesmo.
A meu ver, a unilateralidade desse tipo de apreensão que enfatiza demasiadamente e objetiva analiticamente através do negativo, das limitações, das incapacidades etc., acaba por abafar os meios práticos e simbólicos por meio dos quais as classes populares, a um só tempo, experimentam a superfície vivenciada da vida social e agem criativamente sobre e através das constrições estruturais nas quais estão enredadas. Por mais pesado e sufocante que sejam os limites e condicionamentos há sempre o espaço do improviso onde se plasmam os desejos, as intenções, as valorações provocadas pelo efeito de situações específicas e imprevistas.
Abraços,
Boas ponderações sobre o formidável e atraente trabalho do sociólogo Jessé Souza. Parabéns.
ResponderExcluirOlha Alyson,
ResponderExcluirAcho que nao somente Nietzsche, mas um outro autor - o próprio Michel Foucault que é uma importante influência na arquitetura metodológica de Taylor quando este reconstroi historicamente as formas de moralidade objetiva nas sociedades ocidentais. Como você sabe bem, Foucault vai adotar a gramática de "guerra" ou da "luta" para a compreensao dos processos históricos. Sobre a critica a questao da agência em Jessé e Bourdieu, nesse caso, estou plenamente de acordo com estes dois e digo mais, pelo que conheco de Jessé, a questao da agência e da criatividade dos agentes está contemplada sim nas suas pesquisas empíricas, pelo menos nas que eu participei. Apenas compreendo que, assim como Bourdieu e, acredito, Jessé também, a "criatividade" nao é algo que está dado, mas que é determinado por condicoes materiais e simbólicas que possibilitam esse agenciamento. Nas pesquisas empíricas, essa diferenca do grau do poder de agenciamento entre classes é gritante. Nao se trata de afirmar que as classes dominadas sao "incompetentes" socialmente, mas que seu patrimônio de disposicoes carece muito mais de contextos de atualizacao ou "conversao" das disposicoes ou "capacidades" em "competências". O fato de você falar inglês nao permiti afirmar que você é "competente" em inglês, mas que você é portador de uma "capacidade". É na acao prática que verificamos a ativacao ou nao dessa competência linguistica. Em suma, categorias tais como "criatividade" e "resistência" precisam ser postas empiricamente a prova antes de se sair distribuindo competências aos agentes.De todo modo, concordo com os méritos da empresa sociológica de Jessé que nao sao poucos.E um deles é está honestamente preocupado em desenvolver uma sociologia objetiva com bases científicas bastante sólidas e rigor. Mas sempre podemos avancar um pouco mais. Abracao